A Casa Memória de Camões e o Centro Ciência Viva de Constância (CCVC) podem ter no futuro a sua atividade e funcionamento comprometidos. A Câmara Municipal, associada fundadora do CCVC e da Casa Memória de Camões, está atualmente impossibilitada de comparticipar os dois projetos devido a uma alteração na legislação em vigor.
O artigo 59º da lei 50/2012, que estabelece o regime jurídico da atividade empresarial local e das participações locais, foi alterado pela Lei do Orçamento de Estado de 2017 (OE) que prevê a “obrigatoriedade da celebração de contratos programa” para que os organismos possam ser comparticipados financeiramente.
No caso da Casa Memória de Camões, não existe um contrato programa entre a Autarquia e o organismo.
António Matias Coelho, presidente da direção da Casa Memória de Camões, explicou à Antena Livre que existe somente um protocolo de colaboração com o Município.
“A Câmara Municipal de Constância (CMC) tem um protocolo de colaboração com a Casa Memória de Camões que já é bastante antigo e que consiste numa série de compromissos que a Associação cumpre e a Câmara também. Este protocolo implica uma comparticipação mensal de cerca de 1.100 euros”, explicou.
“A atual direção está em funções, desde abril de 2016, ainda não há um ano, e este protocolo foi uma situação que herdámos das direções anteriores. Sempre funcionou e funcionou bem, sendo que é uma colaboração benéfica para as duas partes”, acrescentou.
Com obrigatoriedade da celebração de um contrato programa entre as duas entidades, António Matias Coelho receia a morosidade do processo.
“O que temos com a Câmara é um acordo de colaboração, não existe um contrato programa. Se ele é necessário é preciso que se faça e que seja presente ao Tribunal de Contas para ser visado. Tudo isto é normal e não vejo problemas neste ponto. O único problema é que estes processos são morosos. Morosos na redação do contrato programa, na sua submissão ao Tribunal de Contas e na obtenção do visto pelo tribunal. É uma situação que pode demorar meses”, alertou o responsável.
“A Casa Memória de Camões tem despesas fixas assumidas para poder garantir o funcionamento dos seus serviços e a prestação desses serviços aos visitantes (…) Estas despesas sempre foram garantidas, fundamentalmente, com o apoio do Município. Se este processo demorar mais do que um mês ou dois, esta situação vai levantar problemas muito sérios de gestão corrente”, fez notar.
Desalentado com a situação, António Matias Coelho afirmou que é preciso “estabelecer normas”, mas “ é bom que se tenha em consideração as situações existentes. É legítimo e correto que se estabeleçam normas e que se obrigue ao cumprimento das mesmas, masque sejam salvaguardadas as situações do presente. Até se garantir o cumprimento das normas no futuro, como é que nós vivemos? Esse é o problema!”.
O responsável disse ainda à Antena Livre ter “esperança que se encontrem soluções para dar a volta à situação”. Até porque entende que “não é correto que as associações dependam excessivamente dos Municípios. Nós queremos libertarmo-nos dessa dependência e sermos o mais possível autossuficientes e nestes poucos meses temos trabalhado muito nesse sentido”.
Casa Memória de Camões
O Centro Ciência Viva de Constância está a ser afetado com esta alteração na lei uma vez que a Câmara Municipal, sendo uma das sócias fundadoras, comparticipa aquele organismo com cerca de 45 mil euros anuais.
No caso do CCVC existe, há cerca de dois anos, um contrato programa com o Município. Contudo, para que seja cumprida a lei, Máximo Ferreira, coordenador daquele organismo, explica que é necessária uma alteração nos estatutos que regulam o CCVC.
“Os contratos programa que funcionaram nos últimos 2 anos entre o CCVC e a CM de Constância funcionaram, pensamos nós, à luz da lei, mas agora é preciso fazer alguma coisa”, explicou Máximo Ferreira, acrescentando que “a lei impõe que sejam alterados os estatutos. Houve já uma reunião conjunta dos três associados do CCVC (Câmara Municipal, IPT e Ciência Viva – Agência Nacional para a Cultura Cientifica e Tecnológica) onde o assunto foi colocado e foi encarada a necessidade de se alterar os estatutos. Se for preciso alteramos os estatutos e o contrato programa há-de cumprir a legislação”.
“A cumprir-se a lei e o contrato programa ficar de acordo com a lei 50 e a lei do OE 2017, fica tudo resolvido. Contudo, é preciso algum tempo e as preocupações maiores estão nesse ponto. Quanto tempo?”, questionou.
Máximo Ferreira afirmou que caso a Assembleia Municipal de abril aprove a alteração dos estatutos,“não haverão problemas porque o CCVC consegue ter sustentabilidade”. Pois, “ a Ciência Viva – Agência Nacional já assumiu a parte da transferência que nos presta. Tenho as coisas controladas até abril/ maio,com este financiamento e com a receita da bilheteira”.
“A minha preocupação incide agora na morosidade do processo, porque numa situação limite pode estar aqui em causa a inviabilidade do funcionamento do CCVC e o vencimento dos profissionais, mas tenho esperança que isto não aconteça”, salientou.
Preocupada com esta situação está Júlia Amorim, presidente da CM de Constância. A autarca afirmou à Antena Livre que o Município está “impedido de apoiar financeiramente a Casa Memória de Camões e a Associação Centro Ciência Viva”.
“Esta questão burocrática que se colocou, impede-nos de ajudar as associações. Se facilitar nós sairmos das associações nós saímos para não inviabilizar o apoio financeiro que prestamos”, referiu a presidente, lembrando que “aquelas associações sem o apoio da Câmara, só com os rendimentos que dispõem, não são autossuficientes”.
Preocupada também com a “morosidade da tramitação administrativa”, a autarca de Constância disse não “compreender o conceito de autonomia do poder local pelos órgãos da tutela, sendo competência própria das autarquias locais a promoção da cultura, bem como o apoio a projetos culturais”.
“Tudo estamos a fazer para não comprometer o funcionamento destas duas associações cujos projetos são estruturantes para afirmação cultural do concelho”, finalizou.
Joana Margarida Carvalho