As AIGP constituem a solução para modificar a paisagem dos territórios do interior do país, cada vez mais desertificados, e devem permitir criar mosaicos que possam criar valor, rendimentos aos proprietários e, acima de tudo, ser um travão aos grandes incêndios que a cada verão assolam estes territórios.
António Louro, vice-presidente da Câmara de Mação e líder da Aflomação (Associação de Produtores Florestais do concelho de Mação) recuou no tempo para lembrar a todos que o caminho que se fez nos finais do século passado foi tão errado que “em 2003 tivemos uma lição da natureza que disse que era preciso muito mais na floresta. Tivemos um incêndio que destruiu metade do concelho e pensávamos que tínhamos tudo preparado para evitar isso.”
Depois de 2003, disse o engenheiro florestal, houve necessidade de repensar tudo o que tinha sido feito e era preciso voltar a fazer, de forma diferente.
“Começámos a fazer trabalho no planeamento, demorou 12 anos, mas criamos o sistema MacFire que esteve, numa primeira fase, nas Comunidades Intermunicipais da Lezíria e do Médio Tejo, até a Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil ter o seu próprio sistema.”
António Louro indicou também que, desde 2003, há a noção que a paisagem tem de se defender, que o pinhal também é um ecossistema. Mas que estas áreas têm de haver agricultura, coisa que se foi perdendo ao longo dos anos, com a litoralização das populações e com a desertificação dos territórios do interior. “A aldeia de hoje colapsou. Existem no território, mas só existe um conjunto de casas. Melhorámos na vida e isso significou o fim das aldeias.”
E António Louro continuou o diagnóstico dando exemplos. “Só Cardigos, com 7 mil hectares de território, tem 16 mil propriedades,” indicou o vereador, depois de ter dito ao primeiro-ministro que a Área Integrada de Gestão da Paisagem (AIGP) de Envendos, a primeira, de 9, com processo de operacionalização em marcha tem proprietários a viver em mais de 120 concelhos de Portugal.
António Louro disse que houve no concelho as duas gerações de Zonas de Intervenção Florestal (ZIF), mas não havia dinheiro e a vontade não era muita. Depois vieram os incêndios de 2017 e 2019 e “limparam” quase tudo o que era verde no concelho de Mação. Portanto, reforçou o que sempre tem dito, ou é agora, ou não é.
Com um elogio ao trabalho do secretário de Estado da Conservação da Natureza e Florestas, João Paulo Catarino, e ao governo, mesmo antes de haver Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), António Louro vincou a importância das AIGP, 70 aprovadas no país, com um envelope financeiro de 220 milhões de euros alocados ao PRR.
Mação tem 9 AIGP em execução. Envendos já está em processo de operacionalização. Ortiga, Castelo, Amêndoa e Penhascoso estão quase prontos. E há um envelope máximo de apoio para Mação que pode ir aos 45 milhões de euros.
António Louro fez o pedido ao secretário de Estado para poder ser alargado o prazo dos registos para além de agosto. E João Paulo Catarino indicou que esse alargamento já está a ser equacionado pelo governo.
E, porque é que o vice-presidente da Câmara de Mação fez o pedido? Porque há muitas propriedades que precisam de ser regularizadas. Só como exemplo, a aldeia do Castelo tem 30% de propriedades indivisas ou em cabeça de casal.
“Aqui não se tira nada a ninguém. A vontade dos proprietários é soberana”, vincou o autarca apontando o dedo a alguns pequenos poderes instalados que continuam a duvidar das AIGP e do futuro e que teimam em dizer que “querem roubar as terras às pessoas.”
Também Vasco Estrela, presidente da Câmara de Mação, foi claro: “A responsabilidade que temos em mãos é fundamental. Está nas nossas mãos fazermos diferente.”
Já o secretário de Estado, João Paulo Catarino, um homem do pinhal interior e ex-presidente da Câmara de Proença-a-Nova destacou a importância de um grande trabalho que tem sido feito nos últimos anos para se chegar agora, a este ponto. Disse o governante que mesmo sem PRR esta estratégia iria avançar com esta dotação financeira, porque só assim o interior do país pode voltar a ser um território resiliente aos incêndios e a outros problemas.
A questão é simples. É preciso criar os mosaicos para defesa dos incêndios, mas acima de tudo é preciso voltar a colocar estas terras a dar rendimento. “E o que disse ao Governo foi que não vale a pena pedir dinheiro às pessoas porque perderam tudo na floresta.” O que o interior precisa é de uma gestão em escala e o primeiro passo foi fazer o cadastro. Depois pensar no que fazer e pagar essa intervenção aos proprietários. E o governante garantiu que ajudar só na intervenção não chega, pelo que o Fundo Ambiental e o Mercado Voluntário do Carbono vão ajudar estes projetos nos próximos 20 anos.
João Paulo Catarino deixou os números. Há uma dotação de 615 ME para floresta com 220 ME para as 70 AIGP do país. “Em Mação há uma possibilidade de termos 45 ME para a floresta. Mas também para a agricultura, para voltarmos a ter o mosaico que tínhamos há 60 ou70 anos.” E o membro do governo deixou a garantia “a estes 45 ME do PRR podem estar mais 45 ME durante os próximos 20 anos.”
João Paulo Catarino, aos jornalistas, disse que ainda existe o segmento de pessoas com dúvidas e voltou a dizer que as pessoas não perderem terra nenhuma. O que vai acontecer é que agora não têm rendimento nenhum, ou só vão ter daqui a uns anos se as árvores crescerem e com uma gestão em mosaicos têm rendimentos imediatos.
E o secretário de Estado vai mais longe e diz que se calhar é preciso que as primeiras AIGP ganhem forma no terreno, pois quando começarem a ver o que se está a fazer e como se está a fazer “todos vão querer aderir”, porque este é o futuro destes territórios.
João Paulo Catarino confirmou ainda que este é um trabalho gigantesco, com milhares e milhares de proprietários, e que já pediu ao Instituto de Conservação da Natureza e Florestas, e outras instituições ligadas à floresta para agilizar os processos com estas entidades que vão gerir “os mosaicos”. E confirmou que os concelhos que não tinham cadastro estão mais atrasados e com mais dificuldades, mas que mesmo assim estão a fazer o ser percurso.
O secretário de Estado indicou ainda que pode haver a implementação do arrendamento forçado, um mecanismo que pode ser aplicado em caso de necessidade para que um processo não fique bloqueado. “Não queremos isso, queremos a adesão voluntária. O que estamos a dizer às pessoas é que nos deixem ajudar, que nos deixem gerir a sua propriedade.”
Neste momento, Oliveira do Hospital é o concelho mais adiantado nas AIGP. Seguem-se Mação e Vila de Rei que já apresentaram propostas. Mação tem apresentada a proposta para Envendos, devendo entregar as de Amêndoa, Castelo, Penhascoso e Ortiga ainda este verão.
Jerónimo Belo Jorge