Foi anunciado a 30 de maio deste ano que Portugal, atualmente, tem uma sobrepopulação de javalis, que se estima perto dos 300 mil exemplares, números que têm que ser reduzidos “para poder mitigar os prejuízos na agricultura e na ocorrência de acidentes rodoviários”.
No mesmo sentido, nos últimos anos tem aumentado o número de javalis avistados na cidade de Abrantes, assim como o número de estragos que estes têm deixado por onde passam. Por este motivo, a Câmara Municipal de Abrantes está a criar um protocolo para a contenção destes animais. Sendo o objetivo principal deste plano “procurar uma estratégia e um enquadramento capaz de mitigar a presença da quantidade excessiva de animais desta espécie aqui dentro da cidade”.
Assim, e em articulação com a Associação de Caçadores de Alferrarede Velha estão a criar estratégias para o controlo de javalis nas zonas urbanas do município. Numa reunião, que teve lugar a 9 de agosto, onde esteve também presente o presidente da Associação de Caçadores de Alferrarede Velha, Orlando Costa, o presidente da Câmara Municipal de Abrantes, Manuel Jorge Valamatos, expressou a preocupação que esta situação tem levantado nos últimos anos: “Nós temos vindo há muito tempo com o ICNF (Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas), a ter reuniões e diálogos sobre esta matéria que nos preocupa. A presença de javalis em zonas urbanas e desde o primeiro sinal de avistamento temos vindo, com o ICNF, procurar aqui soluções. Às associações de caçadores têm feito aqui um trabalho extraordinário connosco, particularmente a Associação de Caçadores de Alferrarede Velha, e com os caçadores que fazem parte desta associação, procurar que sejam emitidos, e tem sido emitidos por parte do ICNF, várias licenças para abates pontuais nas zonas de caça”.
Manuel Jorge Valamatos, presidente CM Abrantes
O presidente, apontou ainda, sendo preciso a emissão de licenças por parte do ICNF para que nas zonas municipais possa haver “alguma ação de abate destes animais”, relembrando sempre que este abate vai ser feito sobre segurança e com o apoio das forças de segurança do concelho: “Nós agora com a Associação de Caçadores de Alferrarede, que está a ajudar imenso neste processo, com o nosso gabinete de Proteção Civil e com as autoridades locais, nomeadamente a PSP, iremos tentar encontrar uma estratégia para fazer aqui alguma correção da densidade desta espécie, no entanto, como devem calcular, nós estamos a falar de zonas urbanas, estamos a falar sobretudo de caçadores e de pessoas. É preciso ter muito cuidado. Isto é algo altamente complexo porque as pessoas não podem andar a disparar nas zonas urbanas para resolver o problema porque depois criam-se, naturalmente, outros. Tem que ser uma estratégia consertada com as autoridades e inclusivamente temos que encerrar vias ao trânsito e às pessoas. E estamos com o ICNF e com a Associação de Caçadores de Alferrarede Velha a procurar montar aqui uma estratégia”. Neste sentido, o presidente explicou que existe um ofício que vai ser enviado ao ICNF com o pedido de autorização para determinar as zonas que vão ser abrangidas por este protocolo: “Temos um ofício que seguirá em princípio hoje (8 agosto) para o ICNF, com um pedido de autorização muito específico para determinar as zonas. Falamos aqui de duas zonas muito em concreto que é a zona ali junto ao hospital e desta zona aqui junto a calçada de São José, portanto, estamos a falar de espaços urbanos onde pôr o cuidado e toda a metodologia tem que ser obviamente muito bem consertada para que posamos ter ali ações de correção. Aquilo que chamamos também a atenção é que nós não estamos apenas a falar de espaços e terrenos públicos, porque nós temos aquilo identificados num dos artigos que são do domínio do Município, mas depois temos muitos espaços privados em que a complexidade desta plataforma (Rubus) onde se faz a solicitação para o possível abate tem que ser feito por cada um dos proprietários. O Município irá junto de cada um destes proprietários tentar encontrar a estratégia em articulação com o ICNF para podermos também nessas zonas poder ter ali alguma ação, mas é um trabalho que estamos a construir há muito tempo e que há muito tempo temos perseguido e vamos ver se conseguimos que esta situação se possa minimizar”.
Manuel Jorge Valamatos, presidente CM Abrantes
Sendo que nem todos os terrenos são municipais e que os própios proprietários são os que têm que fazer a inscrição para o pedido de autorização na plataforma ´Rubus´ para que os caçadores tenham autorização, por parte do ICNF, para se posicionarem nestas zonas. O presidente relembrou que “a lei obriga neste momento a cada um dos proprietários a entrar nesta plataforma e fazer esse pedido”, igualmente admitiu que “nem todos os proprietários estão com essa preocupação”: “Tem que haver aqui um trabalho muito bem consertado, entre todos esses proprietários. São muitos mais do que aquilo que se possa pensar e a autarquia com o ICNF temos vindo desde o final do ano de 2022 a ter várias reuniões no concelho cinegético e várias outras com as associações dos caçadores. Também no âmbito dos nossos briefings, temos feito conversas e debates sobre estas matérias e é sobre isto que estamos a trabalhar para que de forma segura, tranquila, organizada, com metodologias e com estratégias, procuremos aqui uma forma de conseguirmos fazer uma correção relativamente a esta espécie”.
Manuel Jorge Valamatos, presidente CM Abrantes
Desse modo, para se poder efetuar este protocolo, e devido ao facto de ser dentro de uma área urbana, vai ser preciso encerrar algumas zonas, ruas e espaços e vai ser feito durante a noite, assim informa Manuel Valamatos, presidente da CMA: “Estamos a falar de uma ação que têm encostas com grande declive e com vegetação, nós não estamos a falar de um processo simples num espaço aberto... A população será avisada e a presença da PSP e a limitação da circulação quer de veículos, quer de pessoas, tem que ser muito bem organizada e muito bem planeada, portanto, estas ações não são ações fáceis, percebemos a preocupação das pessoas e todos nós temos bem presentes que pode, de facto, haver algum acidente quer rodoviário, quer outro, percebemos que a presença de javalis é muito frequente sobretudo com crias, sabemos da proliferação que acontece com esta espécie e que todos os anos as fêmeas têm aqui várias crias durante o ano e sabemos da perigosidade destes animais em situações de fúria. Atenção que isto não é um assunto novo, os javalis eram avistados em zonas rurais muito perto das casas, há muitos anos que esse processo acontece, esta proximidade às zonas urbanas é muito flagrante, mas é de facto novo, esta espécie começou de alguma forma a ganhar confiança e vai avançando para às zonas urbanas, não é só na cidade de Abrantes, é bom que se diga, são em muitas cidades do país, é a vida a funcionar e nós temos-nos que adaptar e criar as melhores situações em segurança para mitigar este problema”.
Manuel Jorge Valamatos, presidente CM Abrantes
No fim o presidente, destacou à importância de este trabalho ser feito para garantir a segurança das pessoas assim como da espécie, fazendo ênfase em que temos sempre que apelar ao “bom senso e equilibro”: “Este trabalho é um trabalho complexo, este não é um trabalho de se juntarem meia dúzia de pessoas, isto não pode ser feito dessa forma, para garantir a segurança de todos e também a própria regulação da espécie, o abate da espécie também não pode ser indiscriminada, tem que haver aqui bom senso e equilíbrio... Este assunto tem que passar pelo ICNF que é a entidade reguladora, nós não temos autoridade para encetar qualquer ação sem que tenha por base o ICNF”.
Referente ao tempo para elaborar esta ação, informou, que este é um processo que “ainda pode demorar algum tempo” porque “não é um processo que seja feito de aqui a bocado. Nós vamos a emitir hoje um conjunto de emails e informação ao ICNF e depois é um trabalho que tem que ser muito bem articulado com a Associação de Caçadores de Alferrarede Velha, a quem agradeço muito a disponibilidade, o cuidado e a atenção que tem colocado e prestado a este serviço público, e depois precisamos das forças de segurança e todas as entidades que entendamos que são importantes para garantir que não vai haver nenhum acidente”.
Manuel Jorge Valamatos, presidente CM Abrantes
Avistamentos de javalis na zona urbana da Cidade de Abrantes
Os javalis cada dia mais começam a acercar-se das zonas urbanas da cidade, o que tem gerado grande preocupação por parte dos moradores. Os avistamentos desta espécie na zona urbana de Abrantes, é algo que acontece desde há vários anos e que se tem prolongado até os dias de hoje.
Por exemplo, no dia 21 de setembro de 2019, uma moradora da Rua General Humberto Delgado, junto à Escola Secundária Dr. Manuel Fernandes, foi a janela durante a noite e conseguiu avistar “passeando” uma fêmea com os “filhotes detrás” na praceta central da rua.
Depois, no dia 12 de outubro do mesmo ano, na Avenida Dr. Santana Maia, justo na descida para o Hospital de Abrantes, na relva dos separadores, foram avistados novamente, à noite, a fêmea junto das suas crias, esta vez quem captou o momento num vídeo foi Vera Lopes.
Um ano depois, na madrugada de 19 de junho de 2020, Catarina Gil acordou com os latidos do seu cão, que estava preso na sua casota de cimento nas traseiras da moradia. Catarina contou que a aflição do animal fez que saísse à rua ver o que se passava. Na calçada de São José, ao lado das encostas do castelo de Abrantes, foi onde a moradora viu “este bicho enorme a soltar grunhidos” e a atacar o seu cão. Nesta situação, chamou pela ajuda do seu vizinho Joaquim Maria, quem saiu à rua para ajudar a “enxotar o javali dali para fora”.
O cão entrou na casota de cimento para se proteger, mas o javali “continuou a atacá-lo”, e foi ali quando ao meter a boca na casa feriu o cão com o dente, quem segundo a moradora “ganiu muito”, a seguir o javali empurrou a casota pela encosta abaixo com o cão dentro, ao ver isto, Catarina junto com Joaquim começaram a fazer muito barulho para tentarem espantar o javali: “Eu e o meu vizinho a gritarmos muito, fizemos muito barulho e aventamos umas pedras para cima da chapa e ali nós só víamos as ervas só a abanar e nisto ele foi para aquele canavial”.
A filha da Catarina quando soube do sucedido ficou muito preocupada pela segurança dos pais, vizinhos e crianças, assim que decidiu denunciar o ataque na sua página de Facebook. Depois contactou com a Junta de Freguesia de Abrantes e Alferrarede, com a PSP, com a GNR e com as SEPNA (Brigadas de Ambiente da GNR). Contactou também através do email com o ICNF (Instituto de Conservação e Florestas) onde explicou o sucedido.
Além todo o sucedido essa madrugada, os vizinhos informaram também sobre os danos que os javalis tinham provocado anteriormente nas suas hortas. “Atacaram a cultura que a minha vizinha aqui tinha. Além da cultura, atacam as portas das pessoas, já que vêm aqui mesmo às portas, eu tenho a minha mulher que tem uma incapacidade bastante grande, tem uma esclerose múltipla, se ela vem a rua naquele momento era suficiente para ela ´se ficar´. Isto tem que ter uma solução, alguém tem que dar solução a isto”, explica Joaquim Maria, vizinho de Cataria Gil.
Uma semana depois, no dia 21 de junho, domingo, Inês Lopes descia a Avenida Sá Carneiro quando viu, no entroncamento da avenida Eng. Adelino Amaro da Costa junto à Pousada da Juventude de Abrantes, dois javalis adultos acompanhados também pelas crias, mas desta vez a plena luz do dia.
Duas semanas antes, foram avistados javalis nos vales junto à Tapada da Fontinha. Não sendo um sítio habitual para a frequentação de javalis, os locais acreditaram que estes estavam a procura “do fresco de uma linha de água que por ali corre”. Foram neste momento também avistadas duas fêmeas com os “filhotes”. Um morador contou que “no ano passado, uma fêmea fez ali um ninho onde viria ter as suas crias”.
Perante estas situações, nesse momento, a Câmara Municipal de Abrantes entrou em contacto com o ICNF, o presidente Manuel Valamatos salientou que “o assunto está a ser acompanhado pela autarquia e pela proteção civil municipal”. Assim como o presidente pronunciou-se sobre esta questão no momento, a Associação de Agricultores marcou também presença e pediu à população para “não alimentarem estes animais”. Luis Damas, responsável pela Associação de Agricultores, indicou também que com as culturas do milho, os animais vão para essas zonas “onde têm comida e onde têm terras frescas e molhadas, como eles gostam”.
No mesmo momento, o Clube de Caçadores de Abrantes, disse que “o objetivo não é matar animais e nem é assim que está a ser feito o trabalho, a prioridade é tentar desviar os animais das zonas urbanas da cidade e evitar que venham para zonas habitadas ou para as vias de circulação automóvel”.
Conheça os hábitos do Javali e como identifica-los
O Javali é um mamífero de corpo robusto, que pode chegar a 180 cm de comprimento e até 1 m de altura. Podem atingir um peso de 200 kg, mas existem exemplares com mais.
A cabeça do javali macho tem um focinho afunilado, musculado e sensível e da sua boca saem uns caninos muito salientes onde os inferiores são maiores que os posteriores, podendo atingir um comprimento de cerca de 20 cm, os quais se chamam “defesas”. A sua pele é muito dura e a pelagem acastanhada. No verão mudam de pelagem, tornando os seus pelos mais curtos e claros, enquanto no inverno ficam mais escuros, cumpridos e em maior quantidade.
A fêmea apresenta uma cabeça mais estreita e comprida que a dos machos e o seu dorso é mais retilíneo e o seu corpo mais arredondado. As patas traseiras são mais curtas que as dianteiras e são bastante robustas.
A sua visão é pouco eficaz, porem, a sua audição e o seu olfato são bastantes apurados. É um animal que pode viver 20 anos em cativeiro e metade em ambientes naturais.
Os machos são solitários, juntando-se somente ao grupo na época reprodutiva. Os grupos, têm uma ordem matriarcal e são constituídos pelas fêmeas, crias e jovens imaturos, podendo ter os grupos, assim, até 20 elementos familiares. A progenitora é bastante protetora, atacando ao primeiro sinal de perigo contra as suas crias. São animais noturnos, por isso a sua atividade máxima é a partir de anoitecer.
O Javali é omnívoro. A sua preferência alimentícia vai para as bolotas, castanhas, azeitonas e batatas. Mas na sua alimentação também têm lugar ratos, coelhos, minhocas, larvas e carne em descomposição, sendo a componente vegetal maior do que a animal. Desta forma, a sua alimentação varia consoante o locar e a abundância, dado que, este animal pode deslocar-se até 250 km para procurar o alimento que necessita, por isso é que por vezes a procura de alimentos agrícolas leva-os a provocarem estragos nas culturas.
A época de reprodução é no outono. A gestação demora quase quatro meses, as fêmeas parem na primavera entre três a dez crias. Nos primeiros dias mantêm as crias no ninho feito no meio da vegetação para depois se juntarem ao grupo, até os três meses possuem listas alternadamente de cor mais escura e clara, daí a chamarem-se listados.
Reportagem de Jade Garcia
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