Eis que regressa a Sardoal o momento em que o silêncio “se faz ouvir”. A Semana Santa é vivida intensamente e o Turismo Religioso é, cada vez mais, uma aposta do Município. Miguel Borges, presidente da Câmara de Sardoal, fala destes e de outros temas de importância para o concelho.
O Turismo Religioso está a implementar-se cada vez mais em Portugal. Como é que Sardoal se está a posicionar neste segmento?
Melhor do que nós, são aqueles que falam por nós e que nos reconhecem algum mérito no âmbito do Turismo Religioso. Recordo a distinção pelo IPDT - Turismo que coloca Sardoal num dos quatro melhores destinos turísticos entre os vários municípios do país. Não que tenhamos já implementado ou definido, ou mesmo executado, uma estratégia final de turismo mas, pelos passos que temos vindo a dar e pelo potencial que o Sardoal tem no âmbito do turismo. Nós temos um Plano Estratégico para o Desenvolvimento Turístico no âmbito da fé e da religiosidade e é esse plano que temos vindo a desenvolver. Quando revisitamos esse mesmo plano, percebemos que muitas das ações que nos tínhamos proposto fazer, estão concluídas ou em fase de conclusão. Dou o exemplo do Centro de Interpretação da Semana Santa e do Património, um espaço muito bonito e que tem tido reconhecimento como ponto de partida para o que é a visitação ao nosso património no âmbito da fé e da religiosidade. Estamos também a aguardar a decisão da nossa candidatura da Semana Santa a Património Imaterial Nacional. Chamo ainda a atenção de que o Centro de Interpretação não é só a Capela de Nossa Senhora do Carmo, mas todos os percursos que criámos, a identificação de todas as capelas através da leitura de um QR Code onde as pessoas podem entrar e ter explicação de tudo e de todos os pormenores.
O Município de Sardoal foi distinguido como destino turístico de sucesso em Portugal. As apresentações na BTL têm contribuído para alavancar este nicho?
Eu não tenho dúvidas. Todos estes anos em que temos participado na BTL, é curioso que as pessoas, quando se aproximam de nós e vêem que estamos a fazer um tapete, dizem logo que é de Sardoal. É sinal que já associam e identificam os tapetes de flores ao concelho de Sardoal. Já haver este conhecimento generalizado é muito importante. Em Sardoal temos um conjunto de recursos excecionais como o património edificado e o recheio que esse património tem (que não é da Câmara mas sim dos parceiros da Semana Santa). Falo dos quadros do Mestre de Sardoal, do Oratório de Arte Namban, de toda a azulejaria fantástica que temos nas nossas capelas e igrejas... é importante que transformemos todos estes recursos num produto que valorize o que nós temos mas que, ao mesmo tempo, no âmbito do turismo, seja um produto de desenvolvimento económico. E não falo apenas para a nossa pequena economia local mas para algo que possa vir a crescer.
Para este ano, os moldes são os habituais da Semana Santa, com todas as igrejas e capelas da vila enfeitadas com tapetes de flores?
Sim, até porque não há muito a alterar. As procissões e as cerimónias religiosas têm um calendário definido. Contudo, estamos a falar de uma tradição e de um património que convém preservar, o que não quer dizer que não se possa inovar. Mas, fundamentalmente, a estrutura desta Semana Santa é igual todos os anos com as capelas enfeitadas com tapetes de flores, não só na vila mas em todo o concelho. Há cerca de cinco anos desafiámos as pessoas que tomam conta das diferentes igrejas e capelas nas freguesias, e os párocos, para também aí poderem desenvolver tapetes de flores. Depois temos o circuito da visita por todos estes locais em que disponibilizamos o autocarro.
No entanto, há sempre atividades paralelas...
Sim, nesta Semana Santa, vai ainda haver a recriação da Paixão de Cristo pelo GETAS, uma exposição fantástica e que nos diz muito, a nós, sardoalenses, que é uma exposição de fotografias do Paulo Sousa intitulada “Paixão e Luz”. É sobre a Procissão dos Fogaréus mas com retratos já bastante antigos, de uma altura em que ainda não havia o digital. Temos ainda um workshop para elaboração de tapete de flores, em que convidamos as pessoas a elaborar um tapete e, claro, como habitualmente, temos o Doce Quiosque onde mantemos a tradição dos namorados que ofereciam amêndoas às namoradas. Aqui também podemos inovar e podem ser as namoradas a oferecer aos namorados, pela igualdade de género. O importante é que adocemos esta Semana Santa. Não esquecer o Passeio Pedestre que passa pelos tapetes doas arredores da vila e o Concerto de Pascoa pela Filarmónica União Sardoalense na Igreja Matriz.
Crê que a polémica que envolve a Igreja Católica poderá afetar as manifestações religiosas e afastar as pessoas?
Não, temos que separar o trigo do joio. A Igreja Católica, toda esta fé e religiosidade e todas estas manifestações são muito mais importantes do que os homens que as fazem. Sendo certo que, segundo se tem revelado, são homens, alguns deles, criminosos. Estamos a falar de crimes completamente repugnantes e temos que separar as coisas. Não é por um médico cometer um crime que nós vamos deixar de acreditar na medicina. São cosas completamente diferentes. É claro que a dimensão é muito grande mas uma coisa é a fé que cada um de nós tem e outra é a postura de homens que apregoam essa mesma fé e vão contra os princípios da própria fé. Aqui estamos a falar do âmbito criminal e não do âmbito religioso. É um golpe rude numa instituição que terá também alguma culpa e é claro que haverá algum descontentamento, algum desconforto e algum desagrado coletivo mas, de forma nenhuma, poderá influenciar aquilo que é a nossa postura em relação à fé e religiosidade.
No início do ano, nas expetativas para 2023, disse que “depois da pandemia e da guerra o 2023 vai ser muito difícil. É muito importante que as Câmaras estejam muito atentas no apoio aos mais carenciados, aos mais necessitados e mesmo aqueles que momentaneamente possam ter necessidades frutos dos tempos que aí vêm”. Em Sardoal, notou-se o aumento desses apoios?
A Câmara aceitou desde o primeiro momento a delegação de competências na área social e leva a que, neste momento, tenhamos um aumento de trabalho. Não só pelas competências que já eram nossas, mas pelas que nos foram delegadas. Há uma grande preocupação que nos leva a ter uma estreita interligação com os nossos parceiros, as IPSS que estão a passar por uma crise grave. Na verdade, há um conjunto de custos fixos que tem vindo a aumentar brutalmente. Os utentes destas IPSS são pessoas que já estão no limite daquilo que são as suas capacidades financeiras. O Governo não tem acompanhado financeiramente este aumento que as IPSS têm estado a ter e há um outro aspeto importante que nos obriga a uma articulação estreita, que é a escola. A escola é o local onde, muitas vezes, se nota que começam a haver problemas sociais de onde menos se espera. É claro que as classes mais desfavorecidas da nossa população sempre nos mereceram uma grande atenção e sempre demos apoio a essas classes desfavorecidas. Nestes momentos de crise, a nossa atenção tem que ser direcionada também para aquela classe média, ou do que resta dessa classe média - aquele conjunto de pessoas que normalmente não está neste grupo que pede apoios - mas onde se revela uma vergonha num momento de crise. Pessoas que ao longo dos tempos nunca pediram ajuda, nunca precisaram, e agora são dos primeiros a necessitar. É preciso termos uma atenção redobrada para estas pessoas e dizer-lhes que estamos disponíveis.
Mas houve um aumento de pedidos de apoio?
Há alguns contactos. Não posso dizer que haja um aumento mas há sinalizações, há acompanhamentos que estamos a fazer de uma forma muito discreta e é assim que vamos continuar a fazer. Na Ação Social tudo o que queremos é ajudar e apoiar e ninguém precisa de saber a não ser o próprio. E, às vezes, nem o próprio o sabe.
Falou também de outro tipo de intervenções importantes para a população, como a requalificação do edifício da Tapada da Torre e outros edifícios. Como estão esses projetos?
Nós temos uma Estratégia Local de Habitação (ELH) onde temos todos esses edifícios, nomeadamente os da Tapada da Torre onde estamos a terminar a fase de concurso. Esta obra está incluída na ELH, num valor superior a um milhão de euros. Estamos também a terminar a candidatura específica para começarmos a fazer obra porque tudo isto tem que estar acabado antes de 2026. Temos um total de 4 milhões e 145 mil euros na nossa ELH. Esta Estratégia vem no âmbito da legislação que saiu do 1.º Direito, ou seja, ao direito que as pessoas têm de ter uma habitação condigna. Há também outros prédios que são pertença da Câmara Municipal e que estão devolutos e onde incluímos a sua recuperação e entrega a famílias que se enquadrem dentro dos valores da ELH. Por outro lado, há um conjunto de particulares, cerca de 15 beneficiários diretos, que se enquadravam nesta Estratégia, considerando a sua situação económica. Estamos num processo de articulação, com o apoio dos nossos serviços de arquitetura e engenharia, para aconselharmos as pessoas no sentido do que será melhor para a recuperação das habitações. Ainda na nossa Estratégia Local de Habitação, pensámos que podíamos ir mais longe e não faz sentido não termos um espaço onde podemos vir a construir um conjunto de fogos novos, direcionados para o arrendamento a custos controlados e a casais jovens que se queiram fixar no Sardoal. Está tudo pensado e colocado no papel mas não depende só de nós, porque estamos a falar de muitos milhões. Os projetos estão na gaveta e assim que surgirem oportunidades de financiamento, é só fazermos a candidatura.
A instalação de um parque empresarial para a fixação de novas empresas é outro dos objetivos...
Claro que sim. Estamos num processo de revisão do PDM no qual incluímos o alargamento do nosso Parque Empresarial. Estamos a tentar contactar os proprietários dos terrenos envolventes para os podermos ir adquirindo para aspirarmos ao alargamento. É que o nosso Parque Empresarial ficou esgotado muito recentemente. Por outro lado, também temos o Parque de Negócios de Andreus, que é um projeto que foi aprovado e para o qual fizemos um concurso para a empreitada e que ficou deserto. Ou seja, teríamos que rever os valores do projeto, teria de ir novamente a Tribunal de Contas, teria de ser feito um novo concurso e com isto não seria fácil terminar a obra no âmbito deste Quadro Comunitário de Apoio (QCA). E toda a obra que não fosse terminada neste QCA, eram valores que não eram financiados. Em concertação com a CCDR, optámos por retirar a candidatura e voltar a candidatar no próximo QCA, o Portugal 2030.
Um dos temas pelo qual se tem batido é a recuperação das igrejas, principalmente da Igreja Matriz. Há alguma luz ao fundo do túnel?
Pode haver. Recordo que ando com esta insistência desde 2009. Lamentavelmente, a nossa CCDR só incluiu para financiamentos aquilo que é Património Nacional, do Estado. Todo o restante património, que é de interesse nacional, a nossa cultura, a nossa história e nossa tradição, merece e precisa de ser preservado. Esta estratégia faz com que muitas igrejas e muitos monumentos da nossa região centro, possam estar ao abandono ou, pelo menos, sem capacidade de recuperação. Nós, Câmara, temos a nossa ação relativamente minimizada porque estamos a falar de obras num valor, eventualmente, superior a um milhão de euros mas que não é património nosso. Podemos apoiar e sempre dissemos que estamos na primeira linha para ajudar, até financeiramente, para levar esta recuperação a bom porto. Só que não foi este o entendimento. Não há muito tempo, tivemos uma reunião sobre este Quadro Comunitário 2030, com a senhora diretora regional de Cultura do Centro, porque nós não temos Direção Regional de Cultura visto pertencermos a Lisboa e Vale do Tejo que não tem diretor regional e, por isso, dependemos do diretor nacional de Cultura. A diretora regional de Cultura do Centro, que é quem interage com a nossa CCDR em termos de quadros comunitários, tem o mesmo entendimento que nós e já conseguiu fazer um mapeamento daquilo que são as necessidades de intervenção urgentes para incluir no próximo QCA. Nesse mapeamento vem a nossa Igreja Matriz, a Igreja da Misericórdia e vem a Capela da Lapa. São três monumentos que vêm lá incluídos como sinalizados pela Direção de Cultura do Centro com alguma urgência de intervenção e para a qual necessitam de fundos comunitários.
Patrícia Seixas