A União Europeia pode estar a dar uma machadada no Fundo para a Transição Justa no Médio Tejo com a introdução de uma norma que pode impedir as empresas que não são PME, ou seja, empresas de grande dimensão de serem consideradas no concurso em andamento.
Os autarcas foram apanhados de surpresa e estão estupefactos com esta eventualidade, tanto mais que a maior parte dos projetos candidatados ao FTJ no Médio Tejo, 14, foram apresentados por empresas consideradas de grande dimensão, até porque envolvem investimentos de muitos milhões de euros. Dos 4 projetos candidatados para Abrantes, ao abrigo do FTJ, apenas um é de uma PME.
Esta norma pode ser introduzida quando já estão em análise no IAPMEI e no AICEP os 14 projetos que se candidataram ao aviso em causa, num programa que tem uma dotação financeira de 45 milhões de euros.
De acordo com fonte ligada ao processo esta norma a ser considerada surge “a meio do jogo”, o que não está a ser bem acolhido pelos autarcas da região.
A Antena Livre contactou o Ministério do Ambiente e Ação Climática no sentido de saber como é que surgiu agora esta norma e a resposta rápida remeteu esclarecimentos para o Ministério da Coesão Territorial.
De imediato enviamos um conjunto de questões ao ministério de Ana Abrunhosa, mas até ao momento ainda não obtivemos o esclarecimento, apesar da garantia que iria haver uma resposta às perguntas feitas.
A Antena Livre sabe que este processo está a ser gerido com a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) do Centro, entidade que geriu o lançamento do aviso e recebeu todas as candidaturas que foram apresentadas.
Anabela Freitas, presidente da Comunidade Intermunicipal do Médio Tejo, lamentou esta situação e considera-a muito preocupante. É que inicialmente, ainda no anterior governo, o envelope financeiro do Fundo para uma Transição Justa, no Médio Tejo, era de 90 milhões de euros. Na apresentação do programa o Ministério, então tutelado por João Matos Fernandes, apresentou uma alteração. 45 milhões para o Médio Tejo, por causa do encerramento da central a carvão, no Pego, e outros 45 milhões, dos 90 iniciais, foram alocados a reconversão energética e carbónica da indústria vidreira e da cerâmica da região de Leiria.
A presidente da CIMT disse à Antena Livre que quando abre uma candidatura de apoios a nível nacional, os territórios do litoral absorvem-nos. “E isto é que é a verdadeira coesão, abrir candidaturas específicas para territórios que estão deprimidos.”
De acordo com a presidente da comunidade intermunicipal “agora estamos numa outra fase. Não vamos aprovar candidaturas de empresas que não sejam PME (pequenas e médias empresas).”
Mas a presidente salienta “quando abriu a intenção isso não estava no aviso. Eu não posso estar a dizer a uma empresa que não seja uma não PME [e muitas das candidaturas apresentadas são de empresas não PME] que a meio do jogo mudamos as regras.” E acrescentou que “estamos a falar de investimentos de milhões.”
É o que está em cima da mesa. Anabela Freitas vincou que teve conhecimento desta possibilidade ou intenção na semana passada que não faz sentido nenhum e “que estamos a tentar travar”.
Anabela Freitas repetiu que não se pode mudar as regras no meio do jogo e depois deixou clara a sua posição: “Se queremos investimentos de milhões de euros, e temos propostas de 11 milhões, 12 milhões de euros, não é uma PME que tem ‘arcaboiço’ para investimentos destes”.
Sendo o Médio Tejo um território em “terra de ninguém [o Médio Tejo faz parte da NUT II de Lisboa e Vale do Tejo, mas vai buscar os financiamentos à NUT II Centro] dificulta-nos as negociações.”
Anabela Freitas, presidente da CIM Médio Tejo
Recorde-se que a 16 de setembro terminou o prazo para a entrega de candidaturas para este aviso e que resultou na apresentação de 14 projetos para o Médio Tejo, sendo quatro deles (1 PME e 3 não PME) para o concelho de Abrantes.
De notar que haverá ainda um aviso para este mesmo FTJ, mas destinado a candidaturas na área da inovação também para o território do Médio Tejo.
Manuel Jorge Valamatos, presidente da Câmara Municipal de Abrantes, instado a comentar esta notícia que a Antena Livre soube em primeira mão referiu que “é com sentimento de frustração que recebemos uma notícia com esta abordagem. Foram criadas imensas expetativas às empresas e às comunidades e julgamos que não faz qualquer sentido não haver apoio às empresas não PME. Em particular, em Abrantes, temos três candidaturas de empresas não PME.”
O autarca de Abrantes, apanhado de surpresa pela questão da Antena Livre, efetuou de imediato uma série de telefonemas antes de reagir a esta notícia. Depois disse “cremos estar convictos que a União Europeia, a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) e o governo estará atento e não deixará que isso aconteça.” Manuel Jorge Valamatos repetiu várias vezes a palavra frustração quer para as empresas, quer para a comunidade.
O autarca espera que haja aqui uma má interpretação desta situação porque o FTJ é uma ferramenta muito importante para a região. Manuel Jorge Valamatos espera que esta situação não “passe de um equívoco que seja esclarecido” para permitir os investimentos previstos para colmatar o encerramento da central a carvão, do Pego.
Se não existir erro ou equívoco e forem mesmo estas as regras o autarca foi questionado sobre a necessidade de serem tomadas posições de força. Na resposta disse que “estaremos atentos e cuidadosos, e de acordo com as nossas capacidades reivindicativas, vamos pedir para que não haja mudança de regras a meio do campeonato, e que seja feita justiça e se dê capacidade a estes grandes projetos para avançarem para mitigar os impactos do encerramento da central.”
Manuel Jorge Valamatos diz estar otimista e revelou ter esperança que esta “limitação” não aconteça.
Manuel Jorge Valamatos, presidente CM Abrantes
O Fundo para uma Transição Justa é um dos principais instrumentos da União Europeia para apoiar as regiões no processo de transição para uma economia com impacto neutro no clima até 2050.
De acordo com a União Europeia o objetivo do FTJ tem o seguinte objetivo: “O Fundo para uma Transição Justa é um instrumento fundamental para apoiar os territórios mais afetados pela transição para uma economia com impacto neutro no clima, bem como para prevenir o aumento das disparidades regionais. O Fundo tem como principal objetivo a redução do impacto da transição, através do financiamento da diversificação e da modernização da economia local e da atenuação das repercussões negativas sobre o emprego. Para atingir o seu objetivo, o Fundo para uma Transição Justa apoia investimentos em domínios como a conectividade digital, as tecnologias de energia limpa, a redução das emissões, a regeneração de instalações industriais, a requalificação de trabalhadores e a assistência técnica.
O Fundo para uma Transição Justa é executado em regime de gestão partilhada, o que significa uma cooperação estreita com as autoridades nacionais, regionais e locais. Para poderem aceder ao apoio concedido pelo Fundo para uma Transição Justa, os Estados Membros têm de apresentar planos territoriais de transição justa. Esses planos delineiam domínios de intervenção específicos, baseando se para tal nos impactos económicos e sociais da transição. Nomeadamente, os planos devem ter em conta as perdas de emprego esperadas e as necessidades decorrentes da transformação dos processos de produção nas instalações industriais que apresentam uma maior intensidade de emissões de gases com efeito de estufa.
O Fundo para uma Transição Justa dispõe de um orçamento global de 17,5 mil milhões de euros para o período 2021-2027. Um montante de 7,5 mil milhões de euros será financiado ao abrigo do quadro financeiro plurianual e um montante adicional de 10 mil milhões de euros será financiado ao abrigo do Instrumento de Recuperação da União Europeia.”
Numa publicação oficial no Portal do Governo de 8 de julho deste ano são dados a conhecer os pormenores do concurso que fechou a 16 de setembro que que, no Médio Tejo, teve 14 candidaturas apresentadas: “Estão abertas as candidaturas aos Avisos que vão apoiar com 60 milhões de euros a diversificação económica e a criação de emprego nos territórios do Pego/Médio Tejo e Sines/Alentejo Litoral.
As empresas que desejem investir nestes territórios podem submeter projetos de investimento que contribuam para:
- a diversificação, modernização e reconversão da economia, expansão de novas indústrias e novos serviços para apoiar a transição climática e energética;
- a implantação de tecnologias, sistemas e infraestruturas para energias limpas a preços acessíveis, incluindo tecnologias de armazenamento de energia.
Poderão ser apoiadas novas empresas ou as que aumentem a sua capacidade produtiva, bem como as que diversifiquem ou alterem o processo de produção. Serão privilegiadas todas as que produzam bens e serviços transacionáveis e internacionalizáveis nas áreas acima identificadas.
A taxa de financiamento dos apoios varia entre os 30 e os 60% e inclui majorações para projetos localizados em territórios de baixa densidade, que correspondam a prioridades de políticas setoriais para PME e que criem emprego qualificado em novas unidades produtivas.
Os apoios agora disponibilizados visam compensar os impactos negativos do processo de transição para uma economia descarbonizada, que levou ao fim da produção da energia elétrica a partir de carvão nas centrais termoelétricas do Pego e de Sines. O Médio Tejo e o Alentejo Litoral passam um momento de transformação da economia, pelo que se incentiva a criação de emprego, a substituição/reconversão da atividade económica e estimula uma dinâmica de inovação.
Para além disso, esta iniciativa encontra-se totalmente alinhada com os objetivos nacionais em matéria de energia e clima para 2030, assente num desenvolvimento económico descarbonizado com uma perspetiva de reforço de competitividade dos territórios, que se reveste de maior importância tendo em conta o contexto atual de crise energética.”