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“Em Abrantes foi onde encontrei mais pessoas difíceis de lidar. Mas também há pessoas muito boas.”

6/08/2017 às 00:00
Paulo Bispo

Paulo Bispo é motorista do Abusa, em Abrantes, mas é também o representante da empresa aqui e o mecânico que cuida dos dois autocarros ao serviço. Como é daqui, soube do concurso para o Abusa, sugeriu à empresa, que concorreu e ganhou. Conduz o Abusa há 4 anos.

Como é o seu trabalho?

É um trabalho muito difícil, porque a grande maioria dos passageiros são pessoas de idade. É preciso muita paciência para lidar com elas, porque muitas vezes saem à rua para ter com quem falar, que é o motorista, que anda ali com calor, estafado de todo… e a pessoa é capaz de perguntar cinco vezes seguidas “que dia é hoje?”. E há algumas pessoas que são muito difíceis. Em todo lado há pessoas boas e menos boas. Mas em Abrantes, custa-me dizê-lo porque sou de cá, há pessoas que se acham muito importantes. Já trabalhei em muitos lados, de norte a sul do país, e este é o lugar onde encontrei mais pessoas difíceis de lidar. Mas também há pessoas muito boas. Ultimamente, de há um ano para cá, tenho perdido alguns bons amigos que fiz ali e fico triste quando sei da sua morte. Mas nunca fui tão maltratado como em Abrantes. Mas são pessoas de idade…

 

Por exemplo?

Não posso falar disso, porque são pessoas idosas e porque sou o representante da empresa. E por isso, reconheço às pessoas o direito de reclamarem. Mas, como motorista, em quatro anos não vejo que as pessoas tenham apresentado reclamações com fundamento.

Por vezes está muito calor e as pessoas não gostam de estar à espera. Se esperam 10 minutos parece-lhes muito mais tempo, porque os idosos não têm bem a noção do tempo. E, se cá fora estão 40 graus, lá dentro chega aos 60. A Rua Grande, por exemplo, é uma zona muito difícil de fazer, porque não há corrente de ar, o carro aquece muito. E não podemos esquecer que os passageiros do Abusa são pessoas às vezes muito idosas, que requerem muita atenção. E uma pessoa mais nova nem sempre está com paciência para lidar com pessoa de mais idade, e nem sempre está em boas condições porque está cansado ou anda ali com muito calor… e num trabalho diferente do que é habitual, pois a nossa empresa trabalha sobretudo para o turismo.

 

Se mandasse, que decisões tomava?

Deixava as coisas como estão. Não, mandava tapar alguns buracos na rua junto à igreja de S. João, pois o motor do autocarro, e é um autocarro!, chega a bater no chão.

 

Este é um serviço diferente do habitual. Como funciona?

É um autocarro que faz um circuito fechado. Começa às 8horas da manhã e vai até às oito da noite. Sábados, domingos e feriados, das 9 às 15horas, com uma volta diferente, que vai ao parque de São Lourenço e ao cemitério de Santa Catarina. Não tem horários de passagem, nem paragens fixas. A pessoa tem de saber qual é o circuito, espera o carro e quando ele vem levanta a mão a fazer sinal. O carro para e a pessoa sobe. E para sair, é o mesmo, a pessoa diz onde quer sair, o carro para e a pessoa sai. Assim é melhor para as pessoas, sobretudo para as pessoas idosas. A uma pessoa que vem de fora, dizemos que o carro passa mais ou menos de 30 em 30 minutos. Mais coisa menos coisa, porque pode haver demoras: se há um problema, por exemplo se numa rua estreita como a da Câmara, que é uma rua difícil, está uma camioneta a descarregar, pode demorar aí uns 10 minutos, já não é meia hora, são 40 minutos, e  se o motorista nessa volta tem de ir à casa de banho, já demora um pouco mais. Os bilhetes podem ser pré-comprados na Câmara, mais baratos, ou serem comprados ao motorista.

 

E o bilhete é válido por…

O que está estabelecido é que vale duas voltas a partir do lugar onde a pessoa entra. Uma vez ou outra vêm turistas… Digo-lhes que podem fazer uma volta para verem o circuito na cidade e depois, na segunda, dizem onde querem ficar.

 

Costuma haver turistas?

Muito poucos, quanto mais não seja porque um turista não conhece o serviço e não sabe como o pode usar. Os autocarros de turismo costumam parar no largo Primeiro de Maio, mas não sabem o que é o Abusa e que o podem apanhar e ir até ao castelo. Se houvesse alguma informação, creio que havia mais turistas a aproveitar e a visitar o castelo, por exemplo.

 

Em média, quantas pessoas circulam por dia?

Depende dos dias. E nos últimos tempos tenho perdido alguns bons clientes, pessoas por quem já tinha amizade. Mas, em média, ao longo do ano, talvez umas 80 pessoas por dia. Quase só idosos, é muito raro transportar uma pessoa mais nova.

 

O mini autocarro é da Câmara ou da empresa?

É da empresa Vale do Ave, embora a decoração esteja feita pela Câmara. Temos dois carros, o que costuma andar ao serviço e outro para o caso de haver algum problema.

 

E quantos são os motoristas?

O motorista da empresa sou eu, depois temos mais um ou dois para reforço, porque eu tenho outras coisas a fazer. Sou o representante da empresa e, por isso, tenho de ir às reuniões e como sei de mecânica sou eu que faço esse serviço. Em três anos, o carro nunca precisou de ir a uma oficina, mudo pastilhas, faço a reparação do motor, faço tudo. Agora concorremos a mais quatro ou cinco escolas no concelho, se ganharmos o concurso vou ter de me dedicar a outras coisas.

 

Isso significa que a empresa está a apostar nesta zona?

A empresa dedica-se mais ao turismo. Mas como eu estou aqui e faço tudo, como disse, a empresa aproveita, eu trato de tudo e eles não precisam de se preocupar.

 

Alves Jana

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