Engenheiros, informáticos e licenciados em matemática aplicada dedicam-se “24 horas sobre sete dias por semana” nos bastidores ao combate à covid-19, profissionais sem bata que garantem conforto aos doentes e informação em tempo real a quem usa estetoscópio.
“Informamos que o resultado da análise para diagnosticar a covid-19 realizada na consulta do CHUSJ foi negativo” é a mensagem que pelo menos 21.383 pessoas receberam desde 01 de março no telemóvel após realizar teste de despistagem no Centro Hospitalar Universitário de São João (CHUSJ), no Porto.
Entretanto, o número de pessoas referido alterou-se e já cresceu, porque, como muitos outros dados, as atualizações são quase ao segundo nas aplicações criadas no Centro de Gestão de Informática e no Serviço de Sistemas de Tecnologias, Informação e Comunicação do CHUSJ, áreas lideradas por Maria João Campos que, à Lusa, conta como o “ritmo acelerado da covid-19” obrigou a sua equipa a “reinventar-se”.
“Sentiu-se um espírito de missão e quando se consegue pôr uma equipa a sentir esse espírito, reinventam-se soluções que à partida podiam demorar meses. Trabalha-se 24 [horas] sobre sete [dias]. Aquilo que agora é banal, mas muito importante para conforto das pessoas, que é esperar por um ‘sms’ [mensagens], tem por trás um trabalho feito em tempo recorde”, descreve a responsável.
O texto que consta nas ‘sms’ – que segue com as palavras ‘covid-19’ e ‘negativo’ em maiúsculas – é produto de um “acerto de agulhas” entre os profissionais da linha da frente e os profissionais invisíveis dos bastidores.
“Nós somos tecnólogos puros. Queremos o número de carateres correto e o critério a quem enviar. São os clínicos que definem o tipo de mensagem” a enviar, descreve a responsável, atribuindo a “sensibilidade” às equipas médicas, enquanto a sua trabalha os algoritmos que permitem atualizações em tempo real de quadros e gráficos que permitem, por exemplo, antecipar à sexta-feira quantas camas disponíveis precisará o serviço de infecciologia no domingo seguinte.
“O nosso objetivo é otimizar a disponibilidade dos médicos que têm de ocupar-se com quem precisa. Mas também permitir que o façam de forma segura”, sublinha Maria João Campos.
Em causa está o acesso a dados e a ferramentas que parece banal para quem vê séries televisivas, nas quais os ‘tablets’ para consulta da ficha do paciente aparecem ao lado de ventiladores, bisturis e compressas.
Mas a verdade é que esse cenário à Hollywood é, comenta Maria João Campos, “reduzido” e “muito diferente” em Portugal, sendo verdade também que num contexto de pandemia “o uso do papel é complexo” devido ao risco de contágio.
Por isso foram criados questionários padrão para comunicação interna e um sistema de comunicação via rádio para reduzir o número de entradas e saídas em determinados serviços, bem como evitar o desperdício de equipamentos de proteção individual.
Soma-se ao universo de ações covid-19 o universo de milhares de consultas devido a outras patologias que agora são feitas à distância, bem como de reuniões de grupo entre médicos que foram transferidas dos gabinetes para as videoconferências.
“Nem tudo é eletrónico em termos de informação clínica do doente. É preciso digitalizar - e foram digitalizadas centenas de processos. A falta de uma TAC ou de uma ressonância pode comprometer um tratamento inteiro, ou a falta de um especialista numa determinada reunião de grupo, na discussão de um caso oncológico por exemplo, também. Foi preciso distribuir os meios, dar formação (…). Foi surpreendente como as pessoas rapidamente conseguiram adaptar-se a ferramentas de trabalho completamente diferentes das que estavam habituadas”, conta Maria João Campos, que trabalha no CHUSJ desde dezembro de 2015.
Em média, e num contexto pré-pandemia, o Hospital de São João realiza entre 2.000 a 3.000 consultas diárias, um número que “multiplicado por cerca de um mês e meio significa milhares de mensagens enviadas a avisar do cancelamento e milhares de teleconsultas agendadas e realizadas”.
“Agora estamos na fase de preparar o regresso à atividade programada. São outros milhares de mensagens a enviar e a atualização de aplicações sobre blocos operatórios, dados sobre cirurgias”, antecipa Maria João Campos, que lidera a tal equipa de “tecnólogos puros” à qual também coube a missão de criar condições de acesso à rede ‘wi-fi’ desde o momento em que o Governo proibiu visitas aos hospitais de modo a “dar conforto” a doentes e familiares ou materializar os sensores de deteção da temperatura corporal no átrio do hospital.
(LUSA)