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OPINIÃO: «Luís Carmelo e as coisas da consciência», por Luís Barbosa

3/08/2021 às 06:33

SALPICOS DE CULTURA….

“Luís Carmelo e as coisas da consciência”

Gosto de ouvir uma boa história. É um sentimento que me ficou desde que tive a possibilidade de na família ter um avô que gostava de entreter os netos contando-lhes histórias. Hoje utilizo o conto e reconto de histórias de vida como uma técnica que me ajuda a intervir junto de pessoas que pretendem aligeirar os seus delicados sentires.Os meus netos também gostam que lhes conte uma história quando se preparam para dormir, e não raro o que acontece é que acabo por adormecer junto deles sem ter dado pelo facto que a história que estava a contar foi desaparecendo à medida que o sono, o deles e o meu, se aproximava.

Recordo que por vezes achava que a história que o meu avô contava era a mesma que já tinha contado, e também me lembro que não era raro o que me era contado sofria acrescentos de circunstância. Dos meus netos também já recebi advertências, quer por estar a repetir histórias contadas, ou por lhes ter acrescentado um ponto.Considero-me privilegiado por, desde cedo, ter sido sensibilizado para ter no conto de histórias um suporte orientado para o bem-estar, e por ter tido a possibilidade de utilizar esta técnica até mesmo nos domínios profissionais. Ligado às questões da educação e da investigação científica aprendi a importância de introduzir na formação de educadores e investigadores o recurso ao conto e reconto de histórias como auxiliar fecundo na problemática do desenvolvimento humano, e caminhando pelos corredores da saúde tenho tido a possibilidade de ver, como recorrendo-se a esta técnica, se conseguem ganhos significativos ao nível da problemática da cura.

Fui seguidor atento das vicissitudes com que Paulo Freire, uns anos atrás, sempre defendeu no seu Brasil a importância de se ouvirem com atenção as histórias que os índios contavam, e continuo a ter bem em consideração muitas das ideias com que pautou as políticas de Educação no seu país. Claro que por dever de ofício, tenho também em mente o que outros especialistas na matéria vêm deixando dito sobre o assunto. Mais recentemente fiquei sensibilizado por uma obra que escrita por Luís Carmelo, titulada Músicas da Consciência, com o subtítulo, Entre As Neurociências E As Ciências do Sentido, publicada pela Europa – América em 2002, e prefaciada por António Damásio, propõe em ensaio um encontro entre a tradição descritiva e a teórica do funcionamento da mente e, por outro lado, as práticas laboratoriais que se têm preocupado com a maneira como através das histórias que são contadas se consegue encontrar, muitas vezes,a razão de ser de ocorrências que permaneciam ocultas nas profundezas da mente.

O exercício proposto por Luís Carmelo é interessante, já que chamando à colação muito do que Damásio tem estudado, permite penetrar melhor na complexa maneira como a mente traz à consciência muitas das razões porque não raro agimos sem do que se faz se tenha consciência.Por mim, o livro é obra que merece ser lida, já que tratando temáticas que são transversais aos saberes da química, da biologia, da semiótica e da filosofia, permite novos e diversos olhares sobre as questões da mente e da tomada de consciência.

Despeço-me com amizade,

Luís Barbosa*

*Investigador em psicologia e ciências da educação
SALPICOS DE CULTURA, uma parceria com a Associação Internacional de Estudos Sobre a Mente e o Pensamento (AIEMP)

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