O Município é um agregador de vontades que promove um património de Séculos. A Fé e Tradição sempre aconteceram. Município tem feito é a promoção das solenidades, principalmente as que são diferenciadoras. E Miguel Borges aponta a Procissão dos Fogaréus e os tapetes de flores como dois momentos muito próprios de Sardoal.
Entrevista por Jerónimo Belo Jorge
As festividades da Semana Santa e Páscoa sempre tiveram a sua marca e tradição. Mas ganharam outra dimensão regional e nacional quando o Município assumiu esta época como um ponto alto da vila e do concelho?
Falamos daquilo que é a essência da Semana Santa, do Tríduo Pascal (a Paixão, Morte e Ressurreição de Cristo) que, de acordo com o calendário religioso é o momento mais alto da Igreja Católica. Por sua vez, o concelho de Sardoal, mais propriamente a vila de Sardoal, tem um património enorme à volta da Fé e Religiosidade com as capelas e as igrejas e depois o património imaterial que vai desde a música que a filarmónica toca nesta semana, e as procissões e os tapetes de flores. Ou seja, há aqui um conjunto de recursos de extrema importância que é importante preservar, mas também transformar num produto de atratividade para o nosso concelho. Um produto para que as pessoas venham ver o que se faz, que apreciem a beleza destes momentos, sejam ou não crentes. É um momento em que ninguém fica indiferente, aquilo que se passa aqui, no Sardoal.
A entrada de Sardoal no espaço de Turismo Religioso, na BTL, foi mais uma ferramenta para a promoção destas festividades?
Sim, foi uma ideia feliz de, na Bolsa de Turismo de Lisboa, se constituir um pavilhão só para o Turismo Religioso. Na realidade, Portugal tem um património religioso enorme. Não fazia sentido o concelho de Sardoal não estar presente neste grupo de Municípios. É aproveitar tudo isto para a valorização das terras, para dar dinâmica à economia e acrescentar o enriquecimento cultural e espiritual.
Não há concorrência entre estes Municípios, com ofertas semelhantes?
É o nosso país. É um país profundamente Católico mesmo com um Estado laico, tal como os municípios, fruto de uma construção de séculos. Não me parece que seja um mercado concorrencial, diria antes complementar. Há lugar para todos. Aqui bem perto de nós temos outro tipo de festividades e as pessoas têm é de saber aproveitar…
... É a forma de poderem conhecer como cada território organiza as suas festividades?
É uma oportunidade que temos para trazer gente de fora e que não fique só um dia no nosso território. E estando cá neste período tem de haver oferta, que não passa só pela Fé e Religiosidade, que tem de ter um conjunto de atividades paralelas que fazemos. Sempre respeitando a essência que é a Fé e Religiosidade.
Não fazia sentido o concelho de Sardoal não estar presente neste grupo de Municípios com Turismo Religioso
É por isso que Sardoal levou à BTL uma “mostra” da Procissão dos Fogaréus, que surpreendeu os visitantes do evento?
Levámos dois elementos: a Procissão e os tapetes de flores. A BTL tem a particularidade de reunir um país, em termos culturais, etnográficos, religiosos e por aí fora. Procissão dos Passos há em todo o lado, Procissão do Enterro há em todo o lado, já a Procissão da Ressurreição (Domingo de Páscoa) não há em todo o lado. Mas queremos ser diferenciadores é na Procissão dos Fogaréus (Quinta-feira Santa) e depois nos tapetes de flores.
Notou-se, nos visitantes, a curiosidade de saber “o que é isto” (Procissão) que percorreu a BTL?
Sim, a ideia é essa. Há também um efeito surpresa. Porque no meio de tanta cor, tanto som, de festa e de alegria aparece a solenidade de uma procissão. E isso é diferenciador e cria esta interrogação: porquê uma procissão aqui? Mas há pessoas que a vão a acompanhar e vão distribuindo folhetos explicativos do “desfile”.
E agora com o Centro de Interpretação, ao longo de todo o ano pode haver visitas a Sardoal. Não experimentam vivenciar ao vivo, mas podem, digamos, “entrar no espírito Pascal”?
Nós temos estes recursos que queremos transformar num produto. E é um produto de sucesso. Mas como é que podemos valorizar todos os dias do ano? Foi a estratégia para a construção do Centro de Interpretação da Semana Santa para além da recuperação da Capela de Nossa Senhora do Carmo, propriedade do Município. É ter um espaço para quem nos visita, por exemplo, no verão ou nas Festas do Concelho, em setembro, poder perceber aquilo que é a nossa Semana Santa e com o convite para vir ver “ao vivo e a cores”.
Já existem dados estatísticos das visitas ao Centro de Interpretação?
Números concretos não os tenho, mas se que há muitas pessoas que fazem essas visitas. E a função é mesmo esta, é dizer “olhem, isto é o que podem sentir se vierem cá.” Note-se que o Centro de Interpretação vai ao pormenor de ter os cheiros, as essências das flores. Agora, a presença nestes dias é insubstituível. Não há nada que transmita esta vivência, esta espiritualidade que temos nesta Semana Santa.
As solenidades religiosas repetem-se, naturalmente. Mas, em paralelo, há sempre outras atividades, como referiu, como complemento. Quais são este ano?
Vamos ter o lançamento de um livro de fotografia. O Paulo Sousa, o autor, é das pessoas que mais acompanha a nossa Semana Santa como fotógrafo profissional, mas também com o seu olhar de artista de grande nível. É um desafio que fui lançando ao Paulo. Pessoalmente dou muita importância ao papel, ao álbum fotográfico e ao que está lá dentro. Foi um trabalho difícil, o Paulo Sousa teve de fazer um grande trabalho de seleção entre milhares e milhares de boas fotografias. É um trabalho árduo fazer uma seleção curta. Deixa-me muito feliz, na minha última Semana Santa como presidente de Câmara que possamos deixar este documento para divulgar e, ao mesmo tempo, preservar as décadas e séculos desta linha que mantém a Semana Santa. Nós, Câmara Municipal, só temos de contextualizá-lo naquilo que são as oportunidades que os dias de hoje nos dão, nomeadamente na comunicação e de poder fazer chegar mais longe esta riqueza que temos.
É um livro que é um “álbum de fotografias” da Semana Santa?
É muito mais que isso. É ter gente. O Paulo Sousa é um fotógrafo que regista os momentos, as coisas, mas é um olhar sobre as pessoas que sentem a Fé. Ele entra na intimidade religiosa das pessoas. É fácil fotografar as Igrejas ou o património. Agora, sentir a emoção das pessoas numa fotografia, naqueles momentos, não está ao alcance de todos.
Depois haverá uma exposição “Arte Religiosa” de José Laranjeiras, no Centro Cultural Gil Vicente?
É como fazemos todos os anos. É mais uma boa exposição, porque é podermos ver um conjunto de imagens que nem sempre estão acessíveis. Fazem parte de uma coleção particular de um colecionador que ao longo da sua vida tem conseguido juntar uma coleção de grande importância.
"há aqui um conjunto de recursos de extrema importância que é importante preservar, mas também transformar num produto"
Importante continua a ser o projeto Capela, para criar nos mais novos uma “entrada” nas festividades?
Este projeto foi lançado, há mais de 20 anos, porque notávamos, havia essa sensibilidade, que os jovens não estavam a aproximar-se deste trabalho dos tapetes de flores. Apostámos na atração dos jovens. Porque não é apenas fazer o desenho. É perceber porque é que aquele desenho é feito. É sentir os tapetes de flores, cada pétala que se mexe, que é um gesto de grande valorização patrimonial. E hoje vemos, quando são feitos os tapetes, muitos jovens na sua elaboração.
Um ano muito chuvoso pode trazer constrangimentos na apanha de flores para a elaboração dos tapetes?
É sempre uma grande incógnita. Pode permitir ter as flores mais cedo. Mas se chover em cima da apanha das flores pode estragá-las. É sempre uma grande incógnita, mas valoriza muito este trabalho e quem faz este trabalho.
É a última Semana Santa como presidente de Câmara. Há um sentimento especial ou é apenas mais uma, porque para o ano há mais?
Antes de ser presidente de Câmara já participava na Semana Santa. E para o ano continuarei a participar com a responsabilidade que todos os sardoalenses têm de contribuir para valorizar estas atividades. A Câmara Municipal tem um papel mínimo, porque a grande importância é da Igreja, da comunidade, são as Irmandades, são as associações. O Município acaba por ser um agregador de todas estas vontades e promovê-las. Temos é que saber aproveitar o que de bom outros fizeram e ir atualizando conforme os desafios do tempo.