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Ambiente: Protetores solares protegem a pele mas não o ambiente, alertam especialistas

24/05/2025 às 10:07

Os protetores solares, fundamentais para proteger a pele dos raios solares nocivos, são prejudiciais para a natureza e para a saúde dos organismos aquáticos, e possivelmente até para os humanos, alertaram especialistas.

Quando se aproxima a época de praia, investigadoras ouvidas pela Lusa não põem em causa o uso do protetor solar, lembrando os malefícios da exposição direta ao sol, nomeadamente o cancro, mas avisaram também para os problemas para o ambiente de alguns dos compostos, e dizem que nem todos os efeitos estão ainda estudados.

Eva Iñiguez, bióloga, mestre em biologia marinha, está atualmente a fazer um doutoramento sobre a temática no MARE-Madeira (MARE é um centro de investigação marinha que envolve várias universidades).

Em declarações à Lusa afirmou: “os protetores solares são um conjunto de compostos químicos, criados pelo Homem para proteger a pele. Qualquer composto criado pelo Homem colocado no ambiente não é um benefício, todos têm um impacto negativo, embora em medidas diferentes”.

Mas não há filtros solares inofensivos para o ambiente? Eva Iñiguez julga que não. Disse que há a crença de que os inorgânicos (minerais) são menos agressivos para o ambiente do que os orgânicos (químicos) mas “não será bem assim”, embora admita que alguns podem ser menos maus. “Mas não podemos dizer ainda que não têm impacto”.

Uma coisa é certa, afirmou, há compostos orgânicos associados aos filtros solares que causam o branqueamento de corais.

O efeito dos protetores nos corais já é conhecido. Uma entidade pública norte-americana, HRSD, estimou que entre seis a 14 mil toneladas de protetor solar, contendo entre um a 10% de oxibenzona, são libertadas em áreas de recife de coral todos os anos. Muitos estudos mostram que a oxibenzona, também conhecida por ser um desregulador endócrino, pode causar branqueamento de corais, que acontece quando as colónias de pólipos que formam os corais expulsam as algas que com eles vivem.

A Administração Oceânica e Atmosférica Nacional (NOAA), dos Estados Unidos, também alertou que os filtros que bloqueiam a radiação ultravioleta (UV) também têm um impacto negativo nos recifes de coral e noutros ecossistemas aquáticos. A oxibenzona e o octinoxato são compostos nocivos mas há outros.

Esses compostos, e outros, são levados para o oceano quando as pessoas vão nadar, mas também são descarregados pelas Estações de Tratamento de Águas Residuais (ETAR).

Estudos citados por Eva Iñiguez indicam que na costa atlântica francesa são descarregados por dia mais de oito quilos de cremes protetores, nas costas do Havai (que há vários anos proibiu protetores solares com oxibenzona e octinoxato) 36 quilos por dia, e no Caribe mexicano, uma das zonas com mais corais, são despejadas quase 230 toneladas de protetores por ano.

Rita Maurício, professora da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa (NOVA FCT), investigadora do MARE, engenheira do Ambiente, especialista em drenagem e tratamento de águas residuais, também em entrevista à Lusa deixa outro número: “Numa praia com mil visitantes são descarregados 35 quilos de compostos”.

A especialista também disse que há vários anos há evidências das presenças de compostos dos protetores solares em organismos aquáticos, e mesmo humanos, mas que a concentração desses compostos tem vindo a diminuir.

Eva Iñiguez adianta ainda que compostos presentes nos protetores foram encontrados no fundo do mar Adriático mas também em análises feitas a urina e ao leite materno.

Rita Maurício, professora da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa (NOVA FCT), investigadora do MARE, engenheira do Ambiente, especialista em drenagem e tratamento de águas residuais, também em entrevista à Lusa disse que há vários anos que há evidências da presença de compostos dos protetores em organismos aquáticos e no ser humano.

E acrescentou que “numa praia com mil visitantes são descarregados 35 quilos de compostos”.

Rita Maurício explicou que são os mesmos compostos que estão presentes em produtos de coloração do cabelo, em champôs, em muitos cremes de dia e em roupas (para não perderem a cor) e que são espalhados quando as pessoas lavam roupa ou tomam banho, por exemplo.

Ou então são absorvidos pela pele e saem na urina e nas fezes, acabando nas ETAR. Só que as ETAR não foram concebidas para reter esse tipo de compostos e eles acabam por ir parar aos rios e oceanos.

Assim, explicou, os organismos marinhos acabam afetados de duas formas: diretamente pelos resíduos dos protetores dos banhistas, em dias de sol, e indiretamente pelas águas que as ETAR não filtram, durante todo o ano.

Também professora da NOVA FCT e investigadora do MARE, Marta Martins, especialista em poluição marinha e ecotoxicologia, coordenadora do mestrado em Recursos Vivos Marinhos, falou da falta de eficácia das ETAR e admitiu que nos oceanos o perigo dos compostos dos protetores pode ser menor, devido ao facto de se diluir, ao contrário do que acontece num lago ou rio.

Mas salientou os estudos que indicam que os compostos dos protetores podem afetar os organismos aquáticos, por exemplo ao nível da reprodução, do sistema nervoso central ou a nível hepático.

E depois, acrescentou, podem também ter efeitos nas microalgas, no plâncton, o que irá afetar a cadeia alimentar, nomeadamente as larvas e os peixes juvenis, mais suscetíveis.

A especialista destacou a importância de mais estudos, sobre as concentrações e os diferentes efeitos. “Os protetores efetivamente causam efeitos, mas como são importantes para a saúde (proteger a pele) não se fala muito”.

Marta Martins defendeu que devia ser dada prioridade à comercialização de protetores com menor toxicidade ou mesmo zero tóxicos. E considerou “um pouco tonto” que os protetores solares com um menor nível de contaminação sejam mais caros.

A aplicação de protetores, afiançou, não está em causa, o que está em causa são as escolhas. “Mas só um cidadão informado consegue fazer escolhas”.

Lusa

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