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Debate: Aeroporto regional em Tancos é uma “solução” que tem “tudo para dar certo” (C/SOM)

6/02/2020 às 00:00
DR: Antena Livre e Jornal de Abrantes

O mote do debate estava bem explícito: analisar as potencialidades da antiga base aérea n.º3 de Tancos, esmiuçando a sua possível conversão para um aeródromo de voos civis (comerciais).

Localizada na secção da Brigada de Reação Rápida do Exército Português, em Tancos, o aeródromo tem 2440 metros e a porta aberta para servir os interesses regionais e nacionais.

Com o mote dado e com o auditório do Centro Cultural de Vila Nova da Barquinha composto, entre a presença de autarcas da região, militares, empresários e cidadãos, deu-se início ao debate sobre um assunto que é “de extrema importância para a região e não para Vila Nova da Barquinha”, conforme disse o presidente do Município, Fernando Freire.

Na plateia marcaram presença diversos autarcas da região do Médio Tejo: Fernanda Asseiceira (Alcanena), Anabela Freitas (Tomar), Miguel Borges (Sardoal), Vasco Estrela (Mação), Manuel Jorge Valamatos (Abrantes), Sérgio Oliveira (Constância), Ricardo Aires (Vila de Rei), entre outros representantes das autarquias da região

 

O CONTEXTO NACIONAL E A NECESSIDADE DE UMA POLÍTICA DE TRANSPORTES

João Roque, piloto de linha aérea com quase 18 mil horas de voo, foi um dos convidados neste debate, no qual contextualizou o atual crescimento do tráfego aéreo internacional como um cenário que potencia a emergência de novas alternativas aos sobrelotados aeroportos das grandes cidades – para se ter uma noção, a aviação está a crescer 6,2% ao ano: “estamos a duplicar, em 20 anos, o número de aeronaves”.

Mas o porquê da necessidade de outro aeroporto? Explica João Roque que um estudo de 2019 da Boieng aponta a existência de 50.000 aviões em todo o mundo – aviões esses que “vão precisar de aeroportos”.

Com os avanços tecnológicos, que impactam também a nível de aviação, “mudou a forma de fabricar aviões – mais leves, que levam mais passageiros mas ao custo de milha igual ou inferior aos aviões de grande porta”, o que, diz o piloto, levou a uma mudança de paradigma de hub (centro de conexão) para o conceito multipoint – em que se passa a “ligar cidades e aeroportos secundários com aeronaves mais pequenas - isto abre novos conceitos na forma como podemos organizar o transporte aéreo (…) também a nível regional”.

A nível nacional, o comandante defende que ao longo dos anos a história dos aeródromos regionais nem sempre teve ligações regulares por falta de apoio e que enquanto “nós fizemos sub investimento nos aeródromos, nuestros hermanos [Espanha] fizeram o contrário”.

Admitindo que os “erros consecutivos continuam a perdurar” em casos como o possível aeroporto do Montijo - “a insistência num erro grave” - e outros projetos do passado, João Roque admite que “chegámos a um impasse que não permite aos governantes tomar uma decisão” que seja a acertada e a prioridade é “definir uma estratégia nacional” e uma “política integrada”, ao invés de haver somente “uns aeródromos por aí”.

Posição que foi defendida e bem vincada por outros especialistas neste debate, como o antigo piloto de linha aérea e atual académico e professor de Direito no curso de Direito Aéreo na Universidade de Lisboa, Paulo Soares, que explicita que “precisamos de uma política de transportes nacional” e de um “aeroporto para Portugal, que sirva os portugueses” e não “de mais um aeroporto para Lisboa”.

Paulo Soares admite que gostava que “se perdesse um mês ou dois a pensar no que é que queremos: que o transporte aéreo sirva Portugal e o que é que os portugueses podem fazer com o transporte aéreo. Tem de ser um compromisso (…) e é este compromisso que nos vai levar a dizer se queremos mais um aeroporto para servir Lisboa e o resto é paisagem ou queremos efetivamente uma política de transportes que vai ter aeroportos de ponto a ponto, aeródromos no interior para servir o ponto a ponto da nossa diáspora”.

Porque, conclui, “o país precisa, efetivamente, de um aeroporto internacional, mas não é Lisboa”.

Paulo Soares, piloto de linha aérea, fala sobre um aeroporto que sirva Portugal e não só Lisboa

O consenso gerou-se entre os oradores convidados com o presidente executivo da Associação dos Transitários de Portugal, António Martins, a acrescentar aos testemunhos anteriores que a intermodalidade é o “quinto meio de transporte”: “nós não precisamos de uma política de transportes aéreo, nós precisamos de uma política de transportes estratégica para o país”.

 

AS MAIS-VALIAS DE TANCOS

Entre as possibilidades, João Roque deixou a questão no ar: pode o aeródromo tornar-se no terminal 3 do aeroporto de Lisboa?

O também antigo controlador de tráfego aéreo em Tancos assumiu a “centralidade única” e o “potencial muito elevado” deste aeródromo: “Para já, a solução que é necessária e imediata é uma complementaridade a Lisboa. Lisboa está sobrelotada e é preciso rapidamente fazer algo. E Tancos é a solução para se fazer algo rápido e bem”.

Complementa Lisboa, temos a A23 ligada a Tancos”, acrescenta ainda João Roque que dá também uma ideia para instalar passageiros: replicar o terminal 2 em Lisboa dedicado ao tráfego low cost.

João Roque acrescenta que a distância a Lisboa “não é uma tragédia” e dá como exemplo a “maioria dos aeroportos low cost da Europa estão a mais de uma hora de distância dos centros das grandes cidades (Frankfurt, Londres, Paris)”. No caso de Tancos, expõe que, via A23, a distância é de “cerca de uma hora – 126 km”. Fala também de cerca de 14 minutos até à estação de comboios, no Entroncamento.

Já Paulo Soares admite que “no mínimo, Tancos devia ser equacionado” e dá o exemplo do custo da deslocalização da força aérea do Montijo – 100 milhões – e de quanto custa a deslocação de uma unidade militar em Tancos: “zero”.

O piloto e também dirigente do aeródromo de Viseu diz mesmo que “Tancos é uma possibilidade muito forte daquilo que nós queremos numa política de transportes (…) precisamos de uma rede”, e fala ainda sobre a possibilidade de um hub intercontinental que sirva passageiros e carga que teria precisamente o aeródromo de Tancos como local para essa plataforma, devido à “geoestratégia de Tancos”, uma vez que se localiza no interior: “Façamos onde precisamos de desenvolvimento – no interior (…) Tancos tem tudo para dar certo”, diz.

Informações complementadas por António Martins, dos Transitários de Portugal, com a centralidade relativamente ao país, a “uma hora de Coimbra, duas do Porto” que torna Tancos numa “alternativa muito importante para o quinto modo de transporte – intermodalidade”.

António Martins fala sobre a intermodalidade

Além destas mais-valias, António Martins responde à questão: “Porquê Tancos? Por causa do Entroncamento”. Isto porque “se entroncam aqui principais nós rodoviários como a A21, a A23 e a A13”.

Fala também da distância de Tancos a Fátima, que é de cerca de 20 minutos pela autoestrada, e que, em comparação com Monte Real, são 45 minutos. Assume que “Tancos se afigura como a alternativa correta para Fátima”.

Mas porque importa a distância até Fátima? “Os aviões que trazem passageiros para Lisboa trazem, em média por ano, cerca de 3 milhões de passageiros que demandam Fátima”, explica João Roque. Paulo Soares acrescenta que Fátima é o “único tráfego de turismo na Europa que continua a crescer a dois dígitos”.

Mas para que tudo isto se concretize, João Roque diz que é necessário haver “coragem política”: “aquilo que eu sugiro aos senhores autarcas é que se parta para além do aeroporto regional”.

Diz ainda que isto não é “um projeto para amanhã”, mas que é preciso olhar o país em 50/60 anos, “em termos estratégicos, que é aquilo a que não estamos habituados” e não olhar apenas em ciclos de 4 anos.

Durante o espaço destinado à intervenção do público, houve ainda mais-valias que foram salientadas, como a que apontou o presidente da Assembleia Municipal de Vila Nova da Barquinha, António Ribeiro, que falou sobre a vantagem de não haver zonas habitacionais próximas do aeródromo. Também outro cidadão apontou o ponto a favor de Tancos de ter menor risco sísmico do que, por exemplo, Lisboa. Houve ainda quem se oferecesse para ajudar no estudo técnico, neste caso um senhor que tem já trabalho desenvolvido no âmbito do aeródromo de Tancos.

 

O QUE TANCOS PRECISA DE TER?

João Roque apresentou algumas possibilidades para um futuro aeroporto regional em Tancos

Neste debate de ideias e possibilidades, o piloto João Roque apresentou algumas das intervenções que a antiga base aérea de Tancos poderá e deverá ter: “ILS, uma aproximação de instrumentos que permite furar as nuvens até 60 metros sobre a pista e conseguir ver a pista” - algo que já existiu e que está fora de serviço e que envolve cerca de “1 milhão de euros”; a iluminação de pista “tem de ser revista”; torre de controle tem de ser reequipada mas “está lá, já está construída”; “decisão sobre gestão do espaço aéreo, isso é uma questão política e dos militares se aceitam que seja controle civil, se mantém controle militar”; alargamento da placa da antiga esquadra 502 para comportar aviões de médio curso; melhoria de acesso à A23 e construção de terminal tipo 2.

João Roque, piloto de linha aérea, fala sobre aquilo que é preciso fazer no aeródromo de Tancos

Tudo isto num “investimento que rondará os 75/80 milhões” de euros, diz João Roque, comparando este valor como “1/10 do [valor] do Montijo”. Tudo isto também enquadrado numa “política daquilo a que eu chamo ' O Complexo de Aeroportos de Lisboa e Vale do Tejo', a incluir Tancos, mais a Portela e Cascais”, conclui.

 

CIM DO MÉDIO TEJO INICIA ESTE CAMINHO COM O ENTENDIMENTO DE QUE TANCOS “TEM MELHORES CONDIÇÕES”

À direita: Anabela Freitas, presidente do Município de Tomar e da CIM do Médio Tejo

Também presente neste debate, a presidente da Comunidade Intermunicipal do Médio Tejo, Anabela Freitas, interveio para deixar a mensagem de que “não há cores nesta matéria” entre os 13 autarcas da região e que estão de acordo num conjunto de princípios.

Anabela Freitas destacou que “a presença militar no território é importante e portanto tem de ser preservada (…) não queremos perder a presença militar” e disse também que “este caminho que estamos a iniciar não é contra Monte Real nem o Montijo. Entendemos é que temos melhores condições”.

A presidente da CIM do Médio Tejo reiterou também que “a nossa centralidade não se esgota em Portugal: a centralidade deste território é ibérica”.

Esta questão da centralidade é aquilo que nos diferencia”, acrescentou, admitindo que existe a “consciência de que o caminho não é fácil (…) e a argumentação que tenhamos de ter junto, essencialmente, do poder político, tem de ser muito precisa, pragmática, concisa e que consigamos mostrar aquilo que são os nossos pontos fortes”.

Anabela Freitas, presidente da CIM do Médio Tejo, fala sobre as potencialidades de Tancos

A presidente da CIM do Médio Tejo diz ainda que “aquilo que nós vamos defender em relação ao aeroporto de Tancos tem que estar ligado àquilo que é a estratégia nacional do turismo e se nós queremos a coesão territorial (…) temos de ligar à valorização dos produtos endógenos e aí não é só Fátima que vai ganhar, mas é todo o nosso território, não só da nossa Comunidade Intermunicipal mas também das que estão à volta”.

O caminho não vai ser fácil, mas que vamos conseguir vamos, porque, efetivamente, não é a região que ganha, é o país, e é isso que nós precisamos”, terminou.

 

SOBRE O DEBATE

Este debate inseriu-se no conjunto de debates públicos anunciados pela Comunidade Intermunicipal do Médio Tejo que anunciou em janeiro deste ano a aprovação em Conselho Intermunicipal da adjudicação de um estudo preliminar para o aproveitamento do aeródromo de Tancos para aviação civil e respetiva viabilidade. Existia já um estudo sobre a viabilidade do aeródromo que vai ser complementado com o novo trabalho a ser desenvolvido – e que tem como base a possibilidade de Tancos ser a porta de entrada na região através do modo aéreo.

Notícia relacionada: https://www.antenalivre.pt/noticias/medio-tejo-avanca-com-estudos-para-viabilizar-os-voos-comerciais-em-tancos/

 

Ana Rita Cristóvão

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