Os enfermeiros são inequivocamente um dos rostos na luta contra a pandemia de Covid-19. Na linha da frente mas são “poucos em todos os serviços”, “sem compensação de riscos diários” e têm “anos de trabalho por contar”.
Estas são algumas das realidades expostas pelo Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (SEP) em mais um protesto que decorreu esta quarta-feira,29 de julho, em frente à Unidade Hospitalar de Abrantes do Centro Hospitalar do Médio Tejo (CHMT).
Exigem dignidade, valorização e progressão das carreiras que estão congeladas desde janeiro de 2018.
Em declarações à Antena Livre, a dirigente do SEP de Santarém, Helena Jorge, explica que a avaliação destes profissionais não foi efetuada durante períodos diferenciados entre 2004 e 2014.
“Estamos a falar de pessoas que mesmo ao final de 10 anos continuam sem ter os pontos suficientes para poderem aumentar um único índice na carreira”, explica, acrescentando: “neste momento, a percentagem dos [profissionais do CHMT] que foram avaliados os anos todos é mínima. Cerca de 80% dos enfermeiros têm anos não avaliados”.
Helena Jorge, representante SEP Santarém, no protestos dos enfermeiros do CHMT (DR: Antena Livre)
A responsável diz que já por diversas vezes o SEP tentou resolver o problema junto da administração do CHMT, cuja resposta foi a de que “a culpa é da enfermagem, imputou essa responsabilidade aos colegas”.
“Nós já tivemos uma série de reuniões com o Conselho de Administração (CA) do CHMT. Este CA foi dos poucos do país que não avaliou durante muitos anos. Já que não os avaliou, não pode imputar aos enfermeiros a responsabilidade de o fazer”.
Na prática, isto significa que há enfermeiros no CHMT que após mais de 20 anos de trabalho continuam na primeira posição da tabela remuneratória - o equivalente àquilo que aufere um recém-licenciado.
Diz ainda o sindicato em comunicado que “a não transição dos especialistas, inclusive que já detiveram a categoria, continua a discriminar os colegas com mais competências diferenciadas, a auferir remuneração como enfermeiro”.
Helena Jorge admite ainda que o CHMT continua a “fazer discriminação” entre os profissionais que têm um vínculo a CIT (Contrato Individual de Trabalho) e outros que têm um vínculo ligado à função pública (CTFP). Uma diferenciação que se traduz, por exemplo, no tempo de férias ou no ter direito ou não à ADSE.
“A diferenciação entre colegas que exercem as mesmas funções, mas de que acordo com o vínculo, tem direito diferentes, é injusta e imoral”, diz o SEF, que considera “incompreensível” como pode ser “pedido a todos o mesmo e não é dado a todos o mesmo”
O testemunho de Pedro, enfermeiro no serviço de urgências de Abrantes
Pedro Caldeira é enfermeiro no serviço de urgência na Unidade Hospitalar de Abrantes desde 2005.
“Sou CIT há praticamente 15 anos”, diz-nos. Ou seja, tem um vínculo de Contrato Individual de Trabalho, por isso, não tem os direitos que tem um enfermeiro com vínculo de Contrato de Trabalho de Função Pública.
Pedro Caldeira, enfermeiro no CHMT, no protesto esta manhã pela progressão na carreira (DR: Antena Livre)
desta Não tem pontos que lhe permitam a progressão na carreira. “Em termos de vencimento, possuo o mesmo que possuía em 2005, não vendo algum benefício pela minha valorização profissional e pelo percurso que fui construindo ao longo destes anos relativamente aos colegas recém-formados”, diz-nos.
O enfermeiro mostra o seu descontentamento perante a falta de reconhecimento do seu trabalho e da sua carreira “a nível financeiro”, uma vez que apenas se sente valorizado “pelas chefias no serviço” ao nível “do exercício que fazemos diariamente”.
Desmotivação, falta de enfermeiros e uma pandemia que não dá tréguas. E agora?
Perante uma situação que, diz a representante do SEP Santarém, se revela num “desrespeito para com os profissionais” que se encontram “desmotivados” mas que mesmo assim continuam na linha da frente, Helena Jorge mostra-se preocupada com o futuro, uma vez que se junta outro problema à equação: a falta de enfermeiros no Serviço Nacional de Saúde.
“Não há enfermeiros para contratar e se isto continua…”, desabafa, lembrando o nível de exigência acrescido com o aparecimento da pandemia de Covid-19.
A dirigente do SEP Santarém deu conta de que já houve uma reunião com o Ministério da Saúde, na qual o SEP foi questionado em termos de quais as instituições que não fizeram legalmente o descongelamento das carreiras.
“Se nós temos de dar tudo, nós exigimos que cumpram a lei em relação a nós. Não se pode pedir tudo e achar que os profissionais estão dispostos a continuar no SNS a dar tudo o que têm a dar, mas todas as Instituições a continuar a fazer tudo o que querem fazer”, diz.
Hoje em Abrantes, mas a luta dos enfermeiros é nacional, estando o próximo protesto agendado para dia 4 de agosto, no hospital de Santarém.