As temperaturas descem e aumentam as preocupações com o que acontecerá com a pandemia. Estas são algumas das respostas a perguntas que o primeiro inverno covid-19 pode suscitar:
Que influência têm as estações mais frias na transmissão de doenças virais?
O outono e o inverno potenciam a transmissão de vírus, como se vê anualmente nas épocas de gripe sazonal, que decorrem entre novembro e março e têm tido o seu pico entre dezembro e fevereiro. O tempo frio proporciona condições ideais para que as partículas dos vírus viajem pelo ar. O corpo humano também vê diminuídos alguns mecanismos de defesa, como as membranas mucosas, que secam e mais facilmente deixam passar partículas nocivas.
Que risco acrescido pode representar a época outono/inverno na pandemia da covid-19?
O novo coronavírus vai “concorrer” nos próximos meses com a gripe sazonal. É habitualmente uma altura em que aumenta a procura das urgências por causa da gripe, outros problemas respiratórios ou doenças cardiovasculares. A isto acresce a probabilidade do aumento de casos de covid-19, potenciado pelo frio e pela tendência que as pessoas terão de concentrar-se em espaços interiores e sem ventilação natural, condições ideais para os contágios. Como dizia à revista Atlantic em julho passado o diretor do Centro de Segurança Sanitária do hospital norte-americano Johns Hopkins, Tom Inglesby, “à medida que o frio aumenta, as atividades e as pessoas começarão a recolher-se no interior, o que infelizmente aumenta o risco de transmissão e o risco de super-surtos”.
Outro desafio é a capacidade de fazer diagnósticos rigorosos, uma vez que covid-19 e gripe têm alguns sintomas em comum, como dificuldades respiratórias, tosse ou febre.
A resposta à pandemia pode diminuir a intensidade da gripe sazonal?
As medidas e os comportamentos individuais recomendados para evitar a propagação do novo coronavírus – distanciamento físico, uso de máscara em espaços interiores, lavagem frequente das mãos e etiqueta respiratória – têm influência na transmissão da gripe. Assim se viu na época de gripe sazonal deste ano no hemisfério Sul, que pouca expressão teve nos meses entre abril e setembro em países como a Austrália, Argentina ou África do Sul, embora ali se tenham verificado picos de covid-19 que coincidiram com dias de temperaturas mais baixas.
Como é que as autoridades de saúde prepararam o outono/inverno?
Independentemente do sucesso na contenção de contágios de covid-19, com Portugal atrás da Espanha, Itália ou França em número de casos e mortes por milhão de habitantes, o impacto negativo da pandemia no Serviço Nacional de Saúde (SNS) reflete-se em mais de um milhão de consultas que ficaram por fazer, quase um quarto das cirurgias foram adiadas e os tratamentos e diagnósticos de oncologia foram reconhecidamente afetados, entre outros impactos negativos da paralisia de serviços de saúde extra-covid, cujas consequências reais são incomensuráveis.
Recuperar todo o atraso é uma das prioridades do plano outono/inverno anunciado pelo Ministério da Saúde, em que a necessidade de “prestação de cuidados de saúde ‘não-covid-19, quer programados, quer urgentes” surge em terceiro lugar, após a preocupação com “o aumento da incidência” da doença e a maior procura dos serviços provocada pela gripe sazonal e outras infeções respiratórias.
No que toca à capacidade de o SNS enfrentar a procura, nomeadamente das afeções respiratórias, o número de ventiladores aumentou de cerca de 1.100 para 1.800. No setor da Medicina Intensiva, a meta é atingir no fim do ano uma média de 9,4 camas por cada 100.000 habitantes. Desde março, foram contratados quase cinco mil profissionais no SNS, entre médicos, enfermeiros e técnicos.
Define-se ainda uma estratégia para a realização de testes que separe rapidamente doentes com covid-19 dos outros doentes.
No plano estabelece-se ainda o reforço de stocks de medicamentos, dispositivos médicos, equipamentos de proteção e testes nas unidades de saúde, bem como a criação de reservas destes materiais.
Como é que o Governo se propõe olhar para além da covid-19?
Define-se que a vigilância de doentes crónicos, rastreios oncológicos de visão, saúde materna e infantil, vacinação, planeamento familiar e saúde oral são atividades essenciais que têm que ser continuadas para dez milhões de cidadãos, no meio de uma pandemia que em seis meses atingiu cerca de 72 mil pessoas, 2,7 por cento das quais morreram.
Uma das novidades é que na orgânica dos serviços de saúde, é criada uma “equipa de missão” de resposta não-covid-19, com elementos de cada administração regional de saúde, que deverão concentrar-se em tudo além da covid-19.
O seu compromisso deverá ser criar planos de contingência para retomar e manter a atividade programada que ficou desmantelada com a pandemia.
No plano está ainda previsto que haja unidades hospitalares “covid-19 free”, para onde não sejam encaminhados casos de contágio com o novo coronavírus.
Para enfrentar a gripe sazonal, foi também antecipado e alargado o plano de vacinação do SNS. As vacinas começam a partir de 28 de setembro para os grupos populacionais mais prioritários: residentes de lares de idosos, profissionais de saúde, do setor social e, pela primeira vez este ano, grávidas. A partir de 15 de outubro, começa a segunda fase de vacinas, destinada a pessoas com 65 ou mais anos e doentes crónicos.
Lusa