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Tratamento promissor para a doença de Machado-Joseph

24/02/2024 às 10:35

Uma equipa liderada pelo Instituto de Investigação em Ciências da Vida e Saúde (ICVS) da Escola de Medicina da Universidade do Minho demonstrou em ratinhos um tratamento capaz de reduzir a progressão de sintomas motores e de anomalias neuronais na doença de Machado-Joseph. O estudo saiu no “Journal of Clinical Investigation” e propõe um ácido do fígado como potencial fármaco, sendo considerado seguro para ensaios clínicos em humanos.

A equipa usou o ácido tauroursodeoxicólico (TUDCA) quer de forma injetada quer como suplemento nos alimentos. Em ambos os casos, registou-se nos modelos animais a redução de inflamação no cérebro, dos sinais de degeneração e da morte de neurónios, mas também uma clara melhoria dos sintomas motores e um atraso na progressão da doença. “Estamos a abrir portas para uma possível opção terapêutica e identificamos um eventual alvo para desenvolver novos fármacos, trazendo esperança às famílias afetadas por esta doença crónica”, diz a investigadora Patrícia Maciel, vincando a conveniência de, caso seja aprovado, o medicamento poder vir a ser administrado oralmente.

O TUDCA é produzido no fígado e libertado para o intestino, facilitando a absorção de gorduras alimentares. Porém, parece ter também um papel no cérebro, tendo já havido ensaios em pacientes de doenças neurodegenerativas como Alzheimer e Parkinson. A equipa de Patrícia Maciel testou então esse ácido biliar, pela primeira vez, como terapia para a doença de Machado-Joseph.

Também conhecida como “doença do tropeção” ou ataxia espinocerebelosa, esta doença é hereditária, rara e incapacitante, surgindo em geral na idade adulta e com sintomas motores progressivos, como desequilíbrio, descoordenação de movimentos e dificuldade a falar e a engolir, até à eventual paralisia total. Atinge 0.3 a 2 pessoas por cada 100 mil adultos, mas na ilha das Flores (Açores) afeta 1 em cada 140 adultos. Não há ainda tratamento, só opções de alívio temporário dos sintomas.

Descoberta interação no cérebro

A forma como os ácidos biliares impactam no cérebro não está ainda bem compreendida. De facto, os cientistas do ICVS observaram o TUDCA a interagir de um modo até agora desconhecido, ou seja, não com o recetor associado a esse ácido biliar, mas com o recetor de glucocorticoides, que é essencial na ação de hormonas derivadas do colesterol. Bloquear este recetor impedia o efeito do referido ácido na doença de Machado-Joseph, isto é, confirmou-se essa dependência conjunta na ação terapêutica. Além disso, no interior das células cerebrais dos ratinhos com a doença foi observado que o ácido biliar estava a proteger esse recetor de uma destruição excessiva, por parte de moléculas que destroem proteínas danificadas.

Os investigadores tinham encontrado evidências da disfunção do recetor de glucocorticoides tanto no cérebro como no sangue de pacientes com a doença de Machado-Joseph. Isso coincide com os dados agora obtidos nos modelos animais. “Sugere assim que o composto que estudamos terá potencial para ser utilizado em pacientes, devendo então seguir para ensaios clínicos; aliás, o TUDCA é um ótimo candidato, por ser seguro, mesmo a longo prazo, e com poucos efeitos secundários”, frisa Patrícia Maciel.

A equipa do ICVS incluiu também Sara Duarte-Silva, Jorge Diogo da Silva, Daniela Monteiro-Fernandes, Marta Daniela Costa, Andreia Neves-Carvalho, Carina Soares-Cunha, Joana S. Correia, Gonçalo Nogueira-Goncalves, Stephanie Oliveira, Ana Ferreira-Fernandes, Fernando Rodrigues, Joana Pereira-Sousa, Daniela Vilasboas-Campos, Sara Guerreiro, Jonas Campos, Liliana Meireles-Costa e Andreia Teixeira-Castro. O trabalho envolveu igualmente cientistas das universidades do Porto, de Lisboa e de Toulouse (França).

Patrícia Maciel está na UMinho desde 2002 e o seu grupo é uma referência internacional na área, com bolsas do Departamento de Defesa dos EUA e da National Ataxia Foundation, os prémios Pioneer SCA3/MJD e Rafael Hervada, parcerias com associações e biotecnológicas, convites para conferências mundiais e artigos em revistas de topo. Tem feito vários avanços sobre as bases genéticas das doenças neurológicas e psiquiátricas e em possíveis terapias, como a creatina, Citalopram e NLX-112.

 

Universidade do Minho

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