O parlamento debate na quinta-feira, pela terceira vez, a morte medicamente assistida, com projetos de PS, BE, IL e PAN, sete meses após o segundo veto e sem se saber o que fará Marcelo Rebelo de Sousa.
Em discussão em plenário da Assembleia da República vai estar também um projeto de resolução do Chega que pretende a realização de um referendo sobre o tema.
Os quatro projetos retiram a exigência de "doença fatal" como critério para a despenalização da morte medicamente assistida. PS, BE e Iniciativa Liberal propõem a eutanásia em situações de “lesão definitiva de gravidade extrema” ou “doença grave e incurável”. Quanto a este último critério, o PAN estabelece a exigência de “doença grave ou incurável”.
A última versão do decreto, aprovada em novembro de 2021, tinha a seguinte redação das condições para a prática legal da morte medicamente assistida: "Por decisão da própria pessoa, maior, cuja vontade seja atual e reiterada, séria, livre e esclarecida, em situação de sofrimento intolerável, com lesão definitiva de gravidade extrema ou doença incurável e fatal, quando praticada ou ajudada por profissionais de saúde".
Contudo, noutras partes do decreto, aparecia pela primeira vez, no lugar de "doença incurável e fatal", a expressão "doença grave ou incurável", que numa das normas era definida como "doença grave que ameace a vida, em fase avançada e progressiva, incurável e irreversível, que origina sofrimento de grande intensidade".
Das iniciativas que estarão em debate esta quinta-feira, a da IL é a que introduz mais alterações face a este último texto final, propondo que o médico seja atribuído “de forma sequencial, de entre uma lista de médicos especialistas na patologia que afeta o doente, que manifestem interesse em integrar essa lista, elaborada pela Ordem dos Médicos, tendo em conta um critério de territorialidade que promova a proximidade geográfica do médico especialista ao doente”.
Os liberais avançam com um período de reflexão “não inferior a dois dias, durante o qual é obrigatório o acompanhamento psicológico”, entre o agendamento para a prática da morte medicamente assistida e “a administração dos fármacos letais”.
Ao contrário do que acontece com os diplomas de acesso aos metadados ou de emergência sanitária, que o Presidente da República já fez saber que vai enviar para o Tribunal Constitucional, no caso da eutanásia não se sabe ainda o que fará Marcelo Rebelo de Sousa após a sua provável aprovação pelo parlamento.
Desde o início do processo, o chefe de Estado defendeu que deveria haver um amplo e longo debate na sociedade portuguesa, mas recusou sempre revelar a sua posição pessoal e antecipar uma decisão - promulgação, veto ou envio para o Tribunal Constitucional - antes de lhe chegar algum diploma.
No sábado, em Santarém, Marcelo disse que vai “esperar para ver” a lei sobre a eutanásia e afirmou estar “acima dos braços de ferro”.
A primeira vez que os deputados tentaram legislar sobre a matéria foi em maio de 2018 mas os projetos de PS, BE, PAN e PEV acabaram chumbados.
Dois anos depois, os mesmos partidos reapresentaram os projetos, aos quais se juntou a IL, à data representada pelo deputado único, João Cotrim de Figueiredo.
O diploma, aprovado por maioria na Assembleia da República, seguiu para Belém em 18 de fevereiro de 2021 e no mesmo dia, Marcelo Rebelo de Sousa enviou-o para o Tribunal Constitucional para fiscalização preventiva.
Cerca de um mês depois, o TC chumbou a lei e o Presidente vetou o diploma, que regressou ao parlamento, de onde saiu novo texto final aprovado por larga maioria em novembro do mesmo ano, com algumas alterações, nomeadamente, um novo artigo inicial de definições para clarificar conceitos, oito no total, desde a morte medicamente assistida à "lesão definitiva", doença grave ou incurável.
O documento voltou a Belém numa altura em que já estava instalada a crise política após o chumbo do Orçamento do Estado para 2022 e as eleições legislativas marcadas para 30 de janeiro.
No final de novembro, já com o parlamento dissolvido, Marcelo Rebelo de Sousa vetou politicamente a lei, realçando que o novo texto utilizava expressões diferentes na definição do tipo de doenças exigidas e defendeu que o legislador tinha de optar entre a "doença só grave", a "doença grave e incurável" e a "doença incurável e fatal".
No caso de a Assembleia da República querer "mesmo optar por renunciar à exigência de a doença ser fatal, e, portanto, ampliar a permissão da morte medicamente assistida", segundo Marcelo Rebelo de Sousa, optará por uma “visão mais radical ou drástica” e questionou se isso corresponde “ao sentimento dominante na sociedade portuguesa”.
Com um novo parlamento eleito nas legislativas de janeiro, PS e PSD já anunciaram que vão dar liberdade de voto aos seus deputados, sendo que IL, BE, PAN e Livre posicionam-se a favor da despenalização e Chega e PCP contra.
Lusa