O eventual desaparecimento de pequenos animais que vivem nas areias, pedras e plantas aquáticas dos ribeiros, face às alterações climáticas, terá impacto nos ciclos dos nutrientes e do carbono, alerta um estudo internacional, hoje divulgado.
O estudo foi produzido por uma equipa de 13 investigadores de sete países, liderada por Kay Yue e Fuzhong Wu (Fujian Normal University, China) e na qual participou a investigadora portuguesa Verónica Ferreira, do Centro de Ciências do Mar e do Ambiente (MARE) da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC), “que avaliou os efeitos dos invertebrados na decomposição de detritos vegetais em ribeiros a nível global”, frisa uma nota da instituição, hoje enviada à Lusa.
“O eventual desaparecimento dos pequenos animais que vivem associados às areias, pedras e plantas aquáticas dos ribeiros, em resultado de alterações ambientais induzidas pelas atividades humanas ou alterações climáticas, terá um grande impacto na decomposição das folhadas, com efeitos nos ciclos dos nutrientes e do carbono”, sustenta o comunicado.
A investigação para avaliar quais os fatores que controlam o papel dos invertebrados no processo de decomposição de detritos vegetais em ribeiros, envolveu uma meta-análise, técnica que, de acordo com Verónica Ferreira, “permite integração de evidência científica publicada para abordar questões a larga escala e até mesmo novas questões que ainda não tenham sido abordadas empiricamente”.
Deste modo, foram considerados 141 estudos que cumpriam critérios específicos e contribuíram com 2.707 observações em ribeiros não poluídos distribuídos principalmente pela América do Norte, América do Sul, Europa, Ásia Oriental e Oceânia.
Sobre a importância de estudar estes processos, a investigadora da FCTUC realçou que os ribeiros - que constituem a maioria das linhas de água numa bacia hidrográfica – “recebem grande quantidade de detritos vegetais produzidos pela vegetação circundante e são estes detritos que vão sustentar, em grande parte, as cadeias alimentares nestes ecossistemas e também a jusante, incluindo grandes rios e zonas costeiras”.
A decomposição de detritos vegetais, prosseguiu Verónica Ferreira, é, assim, um “processo fundamental em ribeiros, porque sustenta as cadeias alimentares aquáticas e é parte integrante dos ciclos de nutrientes e de carbono a nível global”.
“É especialmente importante compreender quem são os organismos intervenientes neste processo e como é que estes organismos reagem a alterações ambientais, porque alterações na decomposição de detritos vegetais têm implicações nas cadeias alimentares e nos ciclos de nutrientes e de carbono”, argumentou.
Segundo o comunicado da FCTUC, o estudo verificou que, a nível global, “a presença de invertebrados estimula a decomposição de folhadas em média em 74%, sendo o efeito mais forte quanto maior a densidade, biomassa e diversidade de invertebrados”.
Mas “a maior surpresa” para os investigadores, adianta a nota, foi o facto de verificarem “que o papel dos invertebrados na decomposição de folhadas é maior na fase inicial do que nas fases intermédias ou avançadas do processo de decomposição, ao contrário do que se pensava até agora.
“Isto é surpreendente porque tem sido demonstrado que os invertebrados trituradores preferem consumir folhada que já foi colonizada pelos decompositores microbianos que enriquecem a folhada em nutrientes e a tornam mais palatável. No entanto, o maior papel dos invertebrados durante a fase inicial do processo sugere que os invertebrados podem estar menos dependentes da pré-colonização microbiana da folhada do que se pensava”, afirmou Verónica Ferreira.
O estudo mostrou ainda que, à escala global, “características ambientais como acidez da água, concentração de oxigénio e temperatura, e características da folha são igualmente importantes para regular o papel dos invertebrados na decomposição”.
Face aos resultados obtidos, os investigadores destacaram a importância de se considerar os invertebrados “em modelos globais de decomposição de detritos vegetais em ribeiros, para melhor descrever e antecipar os fluxos de carbono a nível global”.
Lusa