A Assembleia Municipal de Santarém chumbou a proposta de abertura de procedimento para concessão da exploração e gestão do mercado municipal, com a oposição unida na crítica à falta de garantias da permanência dos antigos vendedores.
A proposta submetida pelo executivo social-democrata e votada na noite de segunda-feira teve 22 votos contra, 20 a favor e duas abstenções.
Depois da discussão e ainda antes da votação, o presidente da Câmara de Santarém, Ricardo Gonçalves (PSD), recusou retirar a proposta, como tinham sugerido vários dos intervenientes da oposição, considerando a divergência patente no debate sinal da “democracia a funcionar”.
Defendendo a bondade do modelo proposto – que permitiria concessionar a exploração e gestão do mercado municipal por um período de 15 anos -, Ricardo Gonçalves reafirmou o entendimento de que a entrega da gestão a um privado permitirá criar “atratividade” e tornar este equipamento um polo dinamizador do centro histórico da cidade.
Afirmando que este é “um dos mercados mais bonitos do país”, o autarca sublinhou que a proposta elaborada pelo município estudou “os melhores exemplos de mercados concessionados”.
Para o autarca, o caderno de encargos proposto salvaguardava uma “discriminação positiva” em relação aos antigos vendedores do mercado, ideia contestada pela generalidade dos partidos da oposição.
Francisco Mendes, da bancada socialista, leu a carta aberta subscrita por 18 antigos vendedores do mercado, na qual estes se queixam que o caderno de encargos “simula um direito de preferência que na prática não é”, deixando “na mão do futuro concessionário a discricionariedade” de os incorporar ou não no novo espaço.
Em causa está a cláusula 25 do caderno de encargos, a qual declara dever ser “assegurado pelo concessionário o direito de acesso” aos antigos ocupantes do espaço, mas “em igualdade de circunstâncias com outros eventuais interessados”.
Em caso de empate em igualdade de circunstâncias, os antigos ocupantes “gozam de direito de preferência na atribuição de bancas e lojas”, afirma-se no documento.
Este foi o ponto que mais contestação gerou, com os representantes da CDU e do Bloco de Esquerda a oporem-se ainda à entrega da gestão do mercado a privados, por entenderem que, depois de um investimento superior a dois milhões de euros na recuperação do edifício, este património do município, classificado, deve ter gestão pública.
PS e CDS declararam não se oporem à concessão da gestão, mas os socialistas criticaram os valores propostos – pagamento de uma renda mensal de dois mil euros, com um período de carência de dois anos -, bem como o argumento de que o município não pode registar lucro, sob pena de ter de devolver os fundos comunitários recebidos para a obra.
Patrícia Fonseca, do CDS, manifestou a sua incredulidade com a inclusão desta afirmação no estudo económico, considerando-a “surreal”, e colocou várias questões, nomeadamente quanto à taxa de rentabilidade apresentada, de 12%.
Justificando o voto contra com a “extrema insensibilidade social” da proposta para com os antigos vendedores, a deputada centrista afirmou que seria possível conciliar a concessão a privados com a criação de um mercado local de produtores, aproveitando os apoios que existem para estas iniciativas.
Francisco Madeira Lopes (CDU) considerou igualmente que o mercado sem os antigos vendedores “não será o mercado tradicional, de consumo de produtos locais”, lamentando a “lógica de centro comercial” patente na proposta.
Também Vítor Franco (BE) frisou a necessidade de dar prioridade aos produtores locais, considerando que a proposta “desprotege o concelho de Santarém e a sua economia”.
O mercado municipal de Santarém, um edifício de 1930 da autoria do arquiteto Cassiano Banco, conhecido pelos seus painéis de azulejos, está a ser requalificado desde o verão de 2019, segundo um projeto do arquiteto Paulo Henrique Durão, estando a conclusão das obras prevista para novembro, dado que a empreitada inicial teve de ser interrompida para suprir a ausência de fundações.
O executivo social-democrata defende a gestão privada como forma de dinamizar um espaço que funcionava apenas na parte da manhã, para passar a abrir das 07:00 às 24:00 (até à 01:00 às sextas, sábados e vésperas de feriado) e tornar-se um “polo de atração turística, lúdica e cultural”.
Com a remodelação, o mercado municipal contará com 36 bancas para o mercado diário, albergando ainda no seu interior quatro praças destinadas a esplanada e um posto de turismo, para além de 28 espaços para lojas, destinadas a artesanato, geladaria, florista, vinhos e loja de conveniência, entre outros, estando vedada a instalação de supermercados.
Lusa