Centenas de funcionários judiciais participaram hoje, em Santarém, num plenário em que pediram “justiça” e “respeito” e exigiram a reabertura da negociação do estatuto da carreira e o regresso aos compromissos anteriormente assumidos pelo Governo.
Num plenário que se realizou no Jardim da Liberdade, em frente ao Palácio da Justiça de Santarém, com largas centenas de funcionários judiciais vindos de todo o país, incluindo ilhas, e envergando ‘t-shirts’ pretas com a frase “Justiça para quem nela trabalha”, o presidente do Sindicato dos Funcionários Judiciais (SFJ), António Marçal, afirmou que o estatuto colocado em discussão pública é “um ataque” aos trabalhadores e uma “tentativa de captura” do sistema de justiça.
Num plenário em que se ouviram duras críticas ao secretário de Estado Adjunto da Justiça, Mário Belo Morgado, com gritos de “rua”, António Marçal afirmou que o projeto publicado no boletim do Trabalho e do Emprego é “mau demais para ser verdade”, uma “aberração” que só pode ter “rejeição total”.
Referindo as várias manifestações de solidariedade recebidas, tanto da parte de partidos políticos, como o BE (que teve presente a sua deputada eleita pelo distrito de Santarém, Fabíola Cardoso), o PEV, o PCP, que enviaram declarações de apoio, como de organizações sindicais de juízes e de magistrados do Ministério Público e da CGTP, António Marçal afirmou que há ainda pareceres, nomeadamente de constitucionalistas, com “identificação clara de ilegalidades e até inconstitucionalidades”.
Para o SFJ, a melhor solução seria o primeiro-ministro, António Costa, “dar ordem para que se iniciasse formalmente um processo de negociação que tivesse como ponto de partida os compromissos assumidos pela ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, no anterior Governo”.
“Assim teríamos a pacificação da justiça”, disse, advertindo que, se não houver retrocesso, “a luta vai endurecer”, como prova o anúncio feito hoje de uma greve de 15 dias, de 01 a 15 de julho, no juízo de execução de Lousada, e a declaração, em agosto, de períodos de greve nos juízos competentes para tramitar o processo eleitoral autárquico.
“Não é que o queiramos fazer, mas se formos obrigados e não houver da parte do Governo uma disposição para a negociação, que não é apenas formal, mas uma negociação séria que sirva os interesses dos funcionários e da Justiça em Portugal”, irão avançar essas formas de protesto, declarou.
“Este projeto é um perigo porque pode capturar a Justiça por interesses obscuros e nós não entendemos qual a razão por que António Costa deixou publicar este diploma no Boletim de Trabalho e Emprego”, frisou, sublinhando que o número de pessoas presentes no plenário de hoje deve levar a ministra da Justiça e o primeiro-ministro a “arrepiar caminho e voltar ao trilho que pode levar a uma situação de compromisso”.
Questionado sobre as críticas feitas no plenário a Mário Belo Morgado, o presidente do SFJ afirmou que, além de ter feito “letra morta” dos compromissos anteriormente assumidos pela ministra, é “inaceitável” que, sendo juiz conselheiro, “diga que as leis da Assembleia da República e os prazos que nelas constam sejam meramente ordenadores ou programáticos”.
“Isto não cai bem num Estado de direito democrático”, disse, salientando que a escolha de Santarém para a realização do protesto – o qual incluiu a deposição de uma coroa de flores junto à estátua do capitão de Abril Salgueiro Maia – aconteceu “porque é necessário um 25 de Abril na Justiça, para que a Justiça sirva todos os portugueses, independentemente da sua capacidade financeira”.
Entre os aspetos contestados no estatuto está o fim do acesso às categorias profissionais por mérito e a criação de lugares “premiais”, por escolha, o fim da especialização, com a eliminação do quadro de funcionários afetos ao Ministério Público, a divisão da carreira em dois graus, a eliminação de mais de 50% dos cargos de chefia e um sistema de subsídios que na prática reduz a remuneração dos funcionários.
Salientando que muitos funcionários judiciais estão, em alguns casos, há 20 anos na primeira categoria da profissão, com um salário inferior aos mil euros, António Marçal sublinhou a dificuldade em recrutar profissionais, acabando os licenciados por transitar para outros serviços da administração pública.
O presidente do SFJ disse ainda que o tribunal arbitral deu razão ao sindicato na concentração num único dia (quarta-feira) dos serviços mínimos que os funcionários estão obrigados a cumprir durante a greve agendada para Lousada e anunciou que quarta-feira será decidida a criação de um fundo de greve para apoiar os funcionários que vão fazer paralisações prolongadas.
Lusa