O Programa Nacional de Investimentos para 2030 (PNI) foi apresentado no dia 22 de outubro pelos ministros das Infraestruturas e da Habitação, do Ambiente e da Ação Climática e da Agricultura, e pelo Primeiro-Ministro.
No documento, na área do Programa de Construção de “Missing Links” que pretende “concretizar fechos de malha, potenciando os investimentos já realizados, melhorar as condições de segurança rodoviária e fomentar a economia”, vem contemplada conclusão do IC9 – A23, com ligação a Ponte de Sôr, incluindo uma nova ponte sobre o rio Tejo, entre Constância e Abrantes.
Ora, esta não é a primeira vez que uma nova travessia sobre o Tejo aparece em planos nacionais rodoviários ou mesmo no Programa Nacional de Investimentos. E até agora, a construção da dita travessia nunca foi efetuada, apesar do problema ter sido apresentado a sucessivos governos.
Manuel Jorge Valamatos, presidente da Câmara Municipal de Abrantes, disse ao Jornal de Abrantes acreditar que a obra possa ir agora avante e diz ser um momento “de grande satisfação” por ver “a conclusão do IC9 e da travessia sobre o Tejo inscritas no Programa Nacional de Investimentos”.
“Sem esta intenção estar afirmada neste documento, estaríamos numa situação extremamente triste para a nossa região” mas assim, “é um momento de grande entusiasmo e de grande expetativa”, disse o autarca.
O presidente da Câmara de Abrantes lembrou o facto de esta não ser a primeira vez que o PNI contempla a conclusão desta obra mas, como referiu ”este projeto nunca deixou de estar no Plano Nacional Rodoviário”. Para Manuel Jorge Valamatos esta é a hora pois, como afirmou, “percebendo os níveis de investimento para Portugal em função daquilo que é a disponibilização financeira dos fundos europeus, acreditamos termos aqui uma excelente oportunidade da concretização deste projeto há muitos anos falado. Que deixe de estar no papel e que passe a ser uma realidade”.
O autarca atestou a importância deste projeto “que liga a Nazaré até a Abrantes e leva-nos com maior facilidade até ao Alto Alentejo, até Ponte de Sôr”. Destacou ainda a relevância da obra “para as empresas e para a dinâmica económica da região”.
“Nesta altura estamos muito otimistas e com muito desejo que se concretize”, declarou.
A aposta do Município abrantino em alojar empresas na área tecnológica, bem como “a nossa Escola Superior de Tecnologia e toda a aposta e dinâmica do tecido industrial e comercial”, poderá ser assim “um complemento” a empresas da região, devido à melhoria nas acessibilidades, como por exemplo, com o cluster aeronáutico em Ponte de Sôr. “A região vai ganhar com isso. Estamos a aproximar empresas, ciência e desenvolvimento económico”.
A travessia sobre o Tejo
A conclusão do IC9, no troço Abrantes – Ponte de Sôr, um troço de cerca de 35 km's, contempla a construção de uma travessia sobre o rio Tejo. No Plano Rodoviário Nacional de há 20 anos, essa ponte está projetada para o nó da Abrançalha, na A23.
Manuel Jorge Valamatos recordou que a localização desta ponte “teve por base estudos de impacte ambiental, está definida e não apresenta grandes equívocos. É certo que passaram muitos anos mas acho que nada justifica a sua alteração pois isso iria alterar todo um plano e toda uma lógica de acessibilidades”.
“Há, inclusivamente, corredores que ficaram reféns da conclusão do IC9 na zona da Abrançalha. Há corredores onde não foi permitida mais construção, mais desenvolvimento, incluindo instalação de empresas. Ficámos condicionados devido à conclusão do IC9 e não faz sentido qualquer alteração neste momento”, declarou.
Sérgio Oliveira, presidente da Câmara Municipal de Constância, disse, por sua vez, que a inclusão do IC9 no PNI "é um bom pontapé de partida, no sentido de se fazer uma nova travessia sobre o Tejo entre Constância e Abrantes".
"É uma infraestrutura importante para ligar o Alto Alentejo a esta região", acrescentou, sublinhando que o documento representa "apenas um plano nacional de investimentos" e é relativa a uma "construção que já constou de muitos planos e de muitos programas".
Por outro lado, para o autarca de Constância, a construção de "uma única nova ponte sobre o Tejo pode resolver o problema de três municípios" [Constância, Abrantes e Chamusca], tendo defendido que a mesma "deve ser construída entre a estação ferroviária de Santa Margarida da Coutada e a Ribeira de Alcolobre, na margem sul, no concelho de Constância, e no lado norte deveria ser no nó que já existe, e que já fica no concelho de Abrantes".
"É óbvio que isto tem de obedecer a estudos técnicos e há níveis de decisão que não são políticos, mas acho que é uma infraestrutura que serviria toda a região e contribuiria para o seu desenvolvimento", frisou Sérgio Oliveira.
Já Manuel Jorge Valamatos reconhece que o presidente da Câmara de Constância “está a defender os interesses do concelho e da sua comunidade e isso é perfeitamente aceitável”.
O presidente da Câmara de Abrantes frisou que “reivindicar aquilo que se acha que têm direito e que serve melhor o interesse das suas populações não é um problema, não podemos é misturar as coisas”. Explicou depois que “uma coisa é a conclusão do IC9 e uma nova travessia, e eu até julgo que no sítio onde está irá servir muito bem o concelho de Constância. Se existem problemas noutros lugares, terão de ser resolvidos a seu tempo e de acordo com o que é a intervenção do Governo. O que não podemos é estar a confundir projetos que têm mais de 20 anos e que são expectáveis há mais de 20 anos, com outras dificuldades que outros possam ter. São circunstâncias diferentes”.
Manuel Jorge Valamatos considera que “esta nova travessia deverá servir também Constância, Sardoal, Chamusca, Ponte de Sôr... Se cada concelho tiver a sua especificidade de alteração do que quer que seja, deverá obviamente lutar para que isso aconteça mas não confundir aquilo que é a conclusão do IC9 com outras situações mais particulares”.
IC9 uma história do século passado
Nelson Carvalho, presidente da Câmara de Abrantes entre 1993 e 2009
Falar do PNI 2030 está na moda porque representa o mapa de intenções dos grandes investimentos do Estado nos próximos dez anos. E é neste documento que está inscrita a nova travessia sobre o rio Tejo que coloca os autarcas do norte do Ribatejo a vincar uma necessidade premente de uma nova ponte.
A construção de uma ponte que ligue a freguesia, agora vila, de Tramagal à margem norte do Tejo, a Abrantes, é uma ideia antiga. Mais antiga do que a existência do IP6 ou A23, ou Autoestrada da Beira Interior como veio a designar-se.
Quem é de Abrantes e tem mais de 40 anos lembrar-se-á de ouvir o ex-presidente da Câmara, José Bioucas, falar desta obra de engenharia. E o Eng. Bioucas deixou a Câmara em 1989.
Entre as muitas conversas em torno da ponte, a rede rodoviária nacional foi ganhando corpo e a construção de um Itinerário Principal que ligasse Peniche (litoral) a Castelo Branco (zona raiana).
Conta Nelson Carvalho, presidente da Câmara de Abrantes (1993/2009), que ali em meados da década de 90 recebeu na fábrica da Mitsubishi, em Tramagal, o então ministro da Indústria e Energia, Luís Mira Amaral, no tempo do governo de Aníbal Cavaco Silva (outubro de 1991 a outubro de 1995). E, na fábrica, enquanto olhavam para o rio, Nelson Carvalho terá dito qualquer coisa do género: “Senhor ministro ficava ali mesmo bem uma ponte sobre o Tejo”. A esta afirmação do presidente da Câmara, diz Nelson Carvalho, o ministro respondeu. “Quer uma ponte? Faça-a!”
Hoje, 25 anos depois, o ex-autarca diz que percebeu de imediato o que o governante quis dizer. “Como a Câmara não tinha [nem tem hoje] dinheiro, nem condições para avançar para uma obra desta envergadura, tivemos de ir à procura de outra solução”, relembra Nelson Carvalho ao mesmo tempo que explica o trabalho de planeamento seguinte. “Começámos com os técnicos a olhar para os planeamentos e percebemos que o corredor do IC9 era a solução ideal. Vinha da Nazaré e faria a ligação ao IC13, em Ponte de Sor. Com isso estava encontrada a solução para a travessia do Tejo”. Depois, segundo o ex-autarca, “era só 'vender' a ideia ao governo”.
Entretanto, em 1999, no poder estava o governo de António Guterres e, recorda Nelson Carvalho, quando se ouviu falar no Plano Rodoviário Nacional 2000 tentou logo agendar uma entrevista com o então secretário de Estado das Obras Públicas, Crisóstomo Teixeira, que integrava o Ministério do Equipamento Social, liderado por João Cravinho.
E para essa reunião, diz Nelson Carvalho, a estratégia foi muito simples: “Uma conversa curta, porque os governantes têm sempre muito que fazer, mas acompanhada com uns 'bonecos' da ideia da via entre a A23 e Ponte de Sor”. E diz lembrar-se que o secretário de Estado acho uma boa solução. Tanto mais que integrou o Plano Rodoviário Nacional 2000, que ainda está em vigor.
As coisas andaram e em 2009 é apresentado, e posteriormente aprovado, o Plano de Impacte Ambiental do troço do IC9 entre Abrantes e Ponte de Sor.
E entre as definições dos corredores desta via está incluída a localização da travessia sobre o Tejo. Como se pode ver no mapa, algures entre o nó de Abrançalha da A23 até à zona do mirante do Tramagal. Aliás, o plano prevê duas possíveis travessias.
Depois, avançou o projeto e o troço estava integrado numa das concessões que o governo de José Socrates estava a desenvolver. Mas, em 2010, há um novo travão. A concessão do IC9 é suspensa e depois entra a crise, a Troika, e o projeto ficou na gaveta.
Surge agora novamente no Plano Nacional de Investimentos (PNI 2030), apresentado este mês.
Nelson Carvalho, afastado da política desde 2009, diz ao Jornal de Abrantes que agora este IC ainda faz mais sentido do que antes, por via do crescimento e investimento de Ponte de Sor no setor da aviação e aeroespacial. “Temos de pensar em planeamento e não em atravessar o rio. Esta via [IC9] é fundamental para o desenvolvimento do interior do país, para um fortalecimento da ligação do Alentejo à A23”, explica o socialista, acrescentando que independentemente de outras travessias que possam vir a ser equacionadas, esta é “estratégica do ponto de vista nacional”. E vinca: “Não falamos de uma ponte, falamos de uma via fundamental nas acessibilidades nacionais. E já tem estudo de impacte ambiental e projeto”.
Jerónimo Belo Jorge e Patrícia Seixas
Imagens do Estudo de Impacte Ambiental de todo o traçado do IC9 entre a A23 e os Foros de Domingão (Ponte de Sor)
Conclusão do Estudo de Impacte Ambiental, um documento de 44 páginas
Autarca da Chamusca "indignado" com ausência da conclusão do IC3
O presidente da Câmara da Chamusca manifestou “indignação” pela omissão da conclusão do IC3/A13 no Plano Nacional de Investimentos, lembrando que é um compromisso para com um concelho que tem vindo a resolver o passivo ambiental do país.
Paulo Queimado enviou uma longa missiva ao ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos, na qual manifesta a sua indignação por a região ser novamente confrontada com a ausência de qualquer referência à conclusão do troço do IC3/A13, que ligará Vila Nova da Barquinha a Almeirim (previsto desde 2007), no Plano Nacional de Investimentos/PNI 2030.
Para o autarca, além de se tratar de um “projeto estruturante” para a região, esta ligação foi assumida como uma contrapartida aquando da construção naquele concelho do Ecoparque do Relvão na Carregueira, para onde são encaminhados os resíduos perigosos de todo o país e onde funcionam, desde 2008, os únicos dois Centros Integrados de Recuperação, Valorização e Eliminação de Resíduos Perigosos (CIRVER) existentes no país.
“Estamos a resolver os problemas dos nossos vizinhos, e bem, mas, por outro lado, temos as nossas populações a reclamar porque o nosso não é resolvido”, disse, salientando ainda o risco de perda de interesse de manifestações de investimento na ordem dos 100 milhões de euros no Ecoparque, negociadas no pressuposto da conclusão do IC3.
Paulo Queimado lembrou que, diariamente, “centenas de camiões com resíduos perigosos” atravessam as localidades de Almeirim, Alpiarça, Vale de Cavalos, Chamusca, Pinheiro Grande, Carregueira, por não terem outra alternativa senão usar a Estrada Nacional 118, quando vêm de sul.
C/ Lusa