Há cada vez mais doenças fúngicas em frutos e legumes. Consequência das alterações climáticas, e não só, estas levam a quebras acentuadas de produção e a um elevado desperdício alimentar. Para as evitar, os produtores recorrem frequentemente à aplicação de fungicidas sintéticos. No entanto, a eficácia destes produtos químicos é cada vez mais reduzida, devido às resistências desenvolvidas pelos fungos patogénicos, e a sua utilização tem um impacto negativo nos ecossistemas e na saúde humana.
Perante este cenário, e tendo em conta o Pacto Ecológico Europeu – que visa a redução em cerca de 50% do uso de produtos fitofarmacêuticos até 2050 no Mercado Único Europeu – investigadores da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP) estão a trabalhar numa alternativa aos pesticidas químicos. Uma espécie de “vacina” com recurso a substâncias naturais a serem aplicadas em frutos e legumes.
É o propósito do projeto “BFree: Biocontrolo de FRutos e de lEgumEs”, financiado em 860 mil euros, ao abrigo do Programa de Recuperação e Resiliência – IFAP – Agenda de Investigação e Inovação para a sustentabilidade da agricultura, alimentação e agroindústria e liderado pela FCUP.
“O nosso objetivo é contribuir para o desenvolvimento e implementação (desde o laboratório até ao campo) de um conjunto de produtos naturais à base de micro-organismos endófitos – isolados de frutos – como agentes de biocontrolo”, explica Susana Carvalho, docente do Departamento de Geociências, Ambiente e Ordenamento do Território da FCUP e investigadora do GreenUPorto – Centro de Investigação em Produção Agroalimentar Sustentável.
E é pelos micro-organismos antagonistas que todo o trabalho está a começar. Neste momento, os investigadores já selecionaram os que têm maior potencial antifúngico sobre os agentes patogénicos que levam às principais doenças. Chegaram, aliás, a 12 diferentes formulações de diferentes micro-organismos. Querem agora analisar o efeito destas formulações promissoras em campo, aplicando-as diretamente nas plantas. O objetivo é perceber qual a interação entre o micro-organismo e o agente patogénico. “Nos primeiros ensaios realizados já foi possível perceber a atividade antifúngica do agente de biocontrolo”, conta a docente. “Na presença do microorganismo, o fungo patogénico cresce para o lado oposto.”
Segue-se uma segunda fase: a da monitorização da eficácia destes tratamentos na prevenção e/ou tratamento de doenças fúngicas, ao longo do ciclo cultural e na fase de pós-colheita, em diversas culturas de frutos e legumes, nomeadamente em morango, framboesa, mirtilo e tomate.
Numa terceira etapa, pretende-se fazer o scale-up das soluções encontradas para condições comerciais, alcançando um universo de 135 produtores hortofrutícolas distribuídos pelo território nacional. Ao longo do projeto, a disseminação dos resultados é uma prioridade dos cientistas da FCUP para poder chegar a qualquer produtor que pretenda adotar uma solução mais sustentável.
“A aplicação de agentes de biocontrolo tem vindo a despertar uma elevada atenção, quer no meio científico quer no meio empresarial, como uma alternativa promissora e sustentável às abordagens convencionais para a gestão de pragas e doenças”, realça a investigadora que está a coordenar este projeto.
O objetivo do projeto é desenvolver ferramentas sustentáveis que permitam diminuir o uso de produtos fitofarmacêuticos que, aliás, têm sido detetados com maior frequência nos frutos e legumes que chegam ao consumidor. O grupo alvo são então as principais doenças fúngicas que afetam frutos e legumes e que levam ao desperdício alimentar, nomeadamente: podridão cinzenta, oídio, míldio, antracnose e cladosporiose.
Para além do GreenUPorto/FCUP, estão também envolvidos neste projeto o Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária, I.P, o Centro Tecnológico Hortofrutícola Nacional (COTHN); Federação Nacional das Organizações de Produtores de Frutas e Hortícolas (FNOP); Proenol – Indústria Biotecnológica SA e mais 10 PME, incluindo Organizações de Produtores e Produtores Individuais.
A equipa da FCUP integra ainda Tânia Fernandes, Antonia Barberio e Nuno Mariz-Ponte.
Faculdade de Ciências da Universidade do Porto