Sobre a Couve de Valhascos, que a geada não estraga, não se sabe porque é que a couve é única nos Valhascos, se pelo clima ou pela qualidade das terras. O que se sabe é que a mesma semente pura noutras regiões do país não “faz” a mesma couve. É por isso que é tão característica e que a população diz que deve ser plantada em junho para poder ser colhida em setembro, para as festas dos Valhascos, ou se for plantada em setembro, para as festividades do Natal.
Miguel Borges, presidente da Câmara de Sardoal, ainda levantou a possibilidade de ou interesse na certificação, mas será um processo muito complicado por causa da necessidade de haver produtores. E não há muitos produtores. Acrescente-se que os que existem plantam a Couve de Valhascos para consumo próprio.
Numa sessão que contou com uma dezena de habitantes, agricultores que mantêm o cultivo da Couve de Valhascos, as explicações para a Couve de Olho, como chamam pela aldeia, pode ter a ver com a qualidade “dos terrenos barrentos, a sul da aldeia, em parte estão agora ocupados por Olival.” Depois adianta um outro habitante que “a nossa couve prefere terrenos barrentos a xistosos.” E um terceiro aventou que “a couve gosta muito de estrume de animais e não de adubos ou fertilizantes artificiais. E hoje o que se usa é o adubo.”
Depois uma outra questão muito abordada tem a ver com a pouca semente pura e as poucas pessoas que têm a semente pura. “E não é a semente que anda a circular nas lojas agrícolas que é a original”, diz um outro participante na sessão, ao mesmo tempo que acrescenta outro habitante que “se não se segura estas poucas plantas, pode perder-se a couve original.”
E de seguida a discussão provocada: “Couve Tronchuda de Valhascos ou Couve de Olho de Valhascos?”
As explicações são rápidas, empíricas, mas assentes na sabedoria popular de quem a semeia há uma vida. “A tronchuda tem mais nervo, mais talo e a outra, [a nossa, dos Valhascos] faz mais bola [olho]e é mais doce. E dá flor amarela ou branca.”
Diz ainda outro participante na sessão que “antigamente nos Valhascos depois de arrancar as batatas plantava-se a Couve de Olho”, e acrescenta, para que não subsistam dúvidas que “é para comer com bacalhau ou peixe.”
Catarina Lourenço, da Tagus, explicou que tecnicamente, “pelas características genéticas é uma Couve Tronchuda, mas por causa das características desta zona passou a ser chamada Couve de Olho. Se quiserem fazer a proteção de região demarcada de produção façam o registo como Couve de Olho de Valhascos. A proteção de nome pode ser muito importante.”
Este debate ou sessão pública marcou o arranque da segunda edição do Festival da Couve de Valhascos e Azeite Novo. Uma conversa em torno da produção e coma presença de produtores locais.
Fausto Jesus, o presidente da Associação Cultural e Recreativa (ACDR) de Valhascos abriu o Festival 2022 com os agradecimentos por parte da coletividade para realização do evento de dois dias.
Miguel Borges, presidente da Câmara de Sardoal, começou por dizer que esta couve tem uma particularidade, é que “a mesma semente noutro local do país dá uma couve diferente.”
Numa ligação da agricultura a outras culturas. Miguel Borges apontou aos Caminhos Literários e ao livro “Onde” do José Luís Peixoto que fala da Couve dos Valhascos.
Miguel Borges, presidente CM Sardoal
Duarte Batista, o presidente da Junta de Freguesia de Valhascos, deixou a nota que “mais importante do que estarmos aqui a falar é vocês (produtores) é vocês falarem da vossa experiência.”
E deixou a esperança de que a pandemia não seja “um interregno deste Festival e queremos dar a conhecer a nossa Couve de Valhascos”.
Duarte Batista, presidente JF Valhascos
Conceição Pereira, coordenadora da Tagus apresentou os programas geridos pela associação de desenvolvimento local. A Tagus dá apoio aos pequenos agricultores e pequenos negócios.
Conceição Pereira disse que a “Tagus abraça estes desafios por isso estamos presentes no Festival.”
Depois começou a apresentar a associação, revelando os valores que a associação já movimentou nos vários programas: Feader - 3,062 Milhões de euros, FSE - 1,465 Milhões de euros e FEDER - 469 mil euros.
E nas linhas de apoio do programa “Portugal 2020” que está agora a terminar há um programa com candidaturas abertas até 15 de dezembro que é o “Renovação das Aldeias” que aponta à revitalização do património e apoio a eventos.
Conceição Pereira, TAGUS
Depois indicou outros programas aos quais os pequenos agricultores ou empresários podem recorrer. Pequenos investimentos nas explorações agrícolas para pessoas singulares ou empresas agrícolas.
O programa “Cadeias Curtas e Mercados Locais” aponta na valorização das pequenas explorações. “Temos que dizer as crianças que na época das laranjas devemos comer laranjas e não bananas. Comer couves e com azeite local. Temos de valorizar as nossas produções”, indicou Conceição Pereira.
E depois deixou a indicação destinada aos produtores: “quem quiser ir vender ao mercado local (por exemplo, Abrantes ou Sardoal) recebe 48 euros por cada deslocação para vender os produtos locais. O que é exigido é que tem de ter atividade aberta em categoria B, porque os subsídios têm de ser declarados."
O programa Cadeias Curtas aponta a apoios de 100 euros a 50 mil euros e o Mercados Locais aponta a apoios entre os 5 mil e os 200 mil euros.
Conceição Pereira, TAGUS
Já o programa “Renovação das Aldeias” tem candidaturas abertas até 15 de dezembro e podem ir a concurso juntas de freguesia e associações. Os projetos apontam à valorização do património e as candidaturas podem ter orçamentos entre os 5 mil e os 200 mil euros com um apoio a 80%.
Quanto ao Futuro, no novo programa Portugal 2030 as apostas são, já se sabe, na preservação e valorização da identidade dos territórios e recursos endógenos; na inovação territorial; no reforço da ligação rural-urbano; no desenvolvimento do microempreendedorismo; na valorização do saber fazer e da intergeracionalidade, e nas iniciativas de desenvolvimento territorial e valorização de recursos.
Conceição Pereira, TAGUS
No final o Grupo de Concertinas de Valhascos, em criação, fez uma aparição e interpretou duas modas, antes de se dar início ao jantar preparado pelo Chef Fernandes.
Grupo de Concertinas de Valhascos
E o jantar foi uma sopa de feijão, uma tiborna de bacalhau em cama de Couve de Valhascos e uma perna de porco assada à camponeses dos Valhascos.
No domingo realizou-se uma caminhada temática “Por ente o Fio de Azeite e a Couve de Valhascos”, um mercado da couve de Valhascos, e um curso de vinhos com o enólogo Fábio Fernandes.
Texto de Jose Luís Peixoto do livro "Onde" integrado no projeto Caminhos Literários
A Couve de Valhascos
A Couve de Valhascos deve ser semeada em junho ou plantada em setembro e outubro para consumir entre setembro e março. O cultivo pode ser feito nos quintais e habitações de Valhascos e nas hortas.
Dizem os habitantes da aldeia que o início de setembro até outubro é a melhor altura para o plantio para ter uma melhor produção. Há mesmo quem diga que deve ser semeada por alturas do Santo António, pois os períodos de plantio ou sementeira têm uma interferência nas propriedades nutricionais da couve.
Com a designação técnica de “Brassica Oleracea”, ou seja, da espécie das couves, pertence às variedades da couve tronchuda. A explicação técnica foi feita por Catarina Lourenço “mesmo sob protesto dos agricultores locais que dizem que não é tronchuda por faz um olho, uma bola”.
De acordo com um painel informativo colocado na Associação Cultural e Recreativa de Valhascos os nomes mais comuns apontam a “couve de folhas, couve portuguesa, tronchuda ou couve de Portugal.”
Tecnicamente a Couve de Valhascos aponta para uma leguminosa de clima mediterrâneo e que pertence à família das crucíferas ou brássicas. Na descrição o seu tamanho é caracterizado “como grande e com um peso que pode ir dos 3 aos 5 quilos e um diâmetro inferior a 90 cm com caule grosso e longo, 10 a 12 folhas de pecíolo e folha arredondada elíptica ou reniforme com cicatriz foliar grande. Cor verde a verde clara. Couve muito tenra, adocicada e aromática.”
A flor pode ser amarela ou branca, são hermafroditas, autoférteis e são, na maioria, polinizadas por abelhas. É uma couve comestível desde o pé, folhas e o olho.
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