“Então eu vou comer uma flor?” É uma pergunta que facilmente podemos fazer, uma vez que o consumo de flores comestíveis, como os bonitos amores-perfeitos, ainda não está na cultura portuguesa. Uma equipa de investigadores portugueses está a explorar, naquele que é um trabalho pioneiro, os benefícios destas flores, com um potencial maior do que possamos imaginar.
O projeto Antho E.flos, liderado pela Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP), através do Laboratório Associado para a Química Verde (LAQV-REQUIMTE), pretende estudar as vantagens para a saúde das flores comestíveis e a melhor forma de as consumir para potenciar os seus efeitos benéficos.
“O objetivo final deste projeto é percebermos de que forma é que podemos consumir estas flores comestíveis, quanto é que temos de consumir e qual é que é a melhor combinação de tudo isto para garantir o melhor resultado a nível nutricional”, conta Hélder Oliveira, investigador do LAQV-REQUIMTE na FCUP, que lidera este projeto.
Desde o seu doutoramento, em 2015, que este investigador tem vindo a trabalhar com antocianinas, um pigmento natural presente na maior parte dos alimentos de cor roxa, vermelha ou azul, conhecido pelo seu poder antioxidante.
A equipa da FCUP está a trabalhar com quatro espécies de flores comestíveis: os amores-perfeitos, os fidalguinhos, os cosmos e a flor de ervilha, sendo que esta última ainda não existe em Portugal. Adicionaram recentemente à investigação os cravos – que, pela sua cor vermelha, também prometem benefícios para a saúde.
“A grande maioria das flores comestíveis contém antocianinas aciladas, o que significa que a antocianina tem diferentes diferentes grupos funcionais ligados aos seus açúcares. Esta ligação, do ponto de vista físico-químico, faz com que essas estruturas sejam consideravelmente mais estáveis”, explica Hélder Oliveira. É esta maior estabilidade que distingue estas flores comestíveis de outros alimentos que também contêm estes antioxidantes como por exemplo o vinho do porto ou os frutos vermelhos.
“A função antioxidante ou bioativa é teoricamente mais relevante no caso deste tipo de estruturas mais complexas, pois, sendo mais estáveis, haverá uma maior atividade no nosso organismo.”, detalha o investigador.
E como será a melhor forma de tirar partido dos benefícios destas flores? Cozidas? Assadas? Na sua forma natural? Esta pergunta levou os cientistas da FCUP a explorar esta componente e os resultados foram apresentados num estudo publicado no início deste ano. Concluíram que estas flores devem ser minimamente processadas, pois apenas se mantêm estáveis a baixas temperaturas.
Os investigadores estão também a estudar como os componentes destas flores são absorvidos pelo nosso organismo, recorrendo a testes em células que mimetizam as do estômago e as do intestino.
“Para além de se perceber do ponto de vista do processamento, qual a forma ideal de consumir estes alimentos, é também crucial entender como é que a ação do trato gastrointestinal, atua no destino final destas antocianinas, seja a nível da sua potencial metabolização, degradação ou absorção”, explica Hélder Oliveira.
Este projeto tem ainda uma componente de análise sensorial. Como ficariam, por exemplo, azeites e vinagres enriquecidos com estas flores? A ideia partiu do Chef Fábio Bernardino e da equipa de Ana Faria, professora Associada na Nova Medical School e co-responsável pelo projeto, que preparou a “receita” e a equipa testou, na comunidade FCUP no dia mundial da alimentação, no ano passado, vários destes produtos inovadores com diferentes flores.
Como próximos passos, os investigadores querem ir mais longe e estudar de que forma é que estes produtos desenvolvidos a partir das flores comestíveis realmente exercem o efeito que está descrito. Pretendem perceber se estas flores podem de facto fazer a diferença nos sintomas associados à síndrome metabólica, como a diabetes ou a hipertensão arterial, num projeto recentemente submetido e sob avaliação.
O Antho E.flos, financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia, foi o primeiro projeto aprovado em Portugal com flores comestíveis e é pioneiro a nível europeu. O projeto, que conta também com investigadores da Universidade Nova de Lisboa e da Nova Medical School, termina oficialmente a 31 de Dezembro.
Faculdade de Ciência da Universidade do Porto