Os resultados de um estudo desenvolvido no Centro de Investigação e Intervenção Social (CIS-Iscte) indicam que as pessoas que consideravam a comunicação do governo português sobre a COVID-19 como tendo uma qualidade superior (isto é, clara, consistente e baseada na ciência), tinham menos probabilidade de acreditar em teorias de conspiração e, por sua vez, mais probabilidade de aceitar e receber vacinas contra a COVID-19.
Segundo Melanie Vauclair, investigadora do CIS-Iscte e primeira autora deste estudo, “muitos estudos associaram positivamente a aceitação da vacina COVID-19 a diferentes variáveis, tais como um nível de educação mais elevado ou um estatuto socioeconómico mais elevado”. Mais importante, a investigadora acrescenta que “a hesitação na vacinação tem sido associada a crenças em teorias da conspiração e a uma falta de confiança nos governos e instituições”.
Alargando a investigação já existente, Melanie Vauclair e Elena Piccinelli, doutoranda no Iscte-Instituto Universitário de Lisboa, exploraram o papel crítico da perceção acerca da comunicação governamental sobre a pandemia COVID-19 na previsão da aceitação da vacina e se esta ligação poderia ser explicada pelas crenças em teorias da conspiração e pela confiança no governo.
377 participantes de Portugal responderam a questionários sobre a sua aceitação geral de vacinas contra a COVID-19, a sua aceitação de uma vacina desenvolvida na China (Sinovac), as suas crenças em teorias da conspiração sobre a COVID-19, a sua confiança nos governos português e chinês, a sua perceção da qualidade da comunicação COVID-19 pelo governo português, e os seus estereótipos sobre o povo chinês. Foram também recolhidos vários dados sociodemográficos.
Após o controlo de fatores relevantes, nomeadamente sociodemográficos e o medo da COVID-19, os resultados deste estudo mostram que uma maior perceção da qualidade da comunicação previu uma maior confiança no governo português e a aceitação geral da vacina. Por outras palavras, as pessoas que consideravam a comunicação do governo português sobre a COVID-19 como sendo clara, consistente e baseada na ciência tinham menos probabilidades de acreditar em teorias de conspiração e, por sua vez, tinham mais probabilidades de aceitar vacinas. No entanto, ao contrário do que as autoras esperavam, a crença em teorias de conspiração não se relacionou com a confiança no governo, que também não estava associada à aceitação geral de vacinas. Elena Piccinelli explica o impacto destes resultados: “Os governos que investem numa comunicação clara e coerente sobre a pandemia podem ser capazes de contrariar a onda de crenças em teorias da conspiração, o que, por sua vez, pode ajudar a aumentar a aceitação das vacinas”.
Além disso, os indivíduos que apresentavam mais estereótipos sobre os chineses eram mais propensos a acreditar em teorias de conspiração sobre o Covid-19 e, por sua vez, confiaram menos no governo chinês, estando menos dispostos a aceitar a vacina Sinovac. “O nosso estudo sugere que os estereótipos sobre a nacionalidade poderão alimentar as teorias da conspiração”, diz Elena. A investigadora explica ainda que “considerar o papel de diferentes variáveis sociopsicológicas é importante para a aceitação da vacina”, mas observa que tais influências devem ser examinadas experimentalmente em investigações futuras.
O estudo foi realizado em Portugal entre março e abril de 2021, durante um confinamento, no qual as pessoas se baseavam sobretudo nas notícias para saber mais sobre a pandemia e as ações governamentais. As autoras refletem que “em retrospetiva, Portugal está numa posição melhor do que muitos outros estados-membros da União Europeia, e levanta-se a questão se as conclusões poderão informar a governação noutros países”. De acordo com o website ourworldindata.org, Portugal tem uma das mais altas taxas de vacinação a nível mundial e a mais alta da Europa.
Pedro Simão Mendes (CIS-Iscte)