A entrada desta poderia ser qualquer coisa deste género: as ruas engalanadas com flores coloridas de papel davam as Boas-vindas aos olhares de centenas de visitantes da vila de Constância. A Filarmónica Montalvense 24 de Janeiro entoava peças musicais numa arruada que anuncia aos sete ventos que é dia de Festa. A Festa de Constância.” Podia ser assim, mas não foi.
Jerónimo Belo Jorge
As ruas estreitas e sinuosas do centro histórico da vila de Constância que descem a encosta em direção aos rios Tejo e Zêzere estavam vazias. Vazias de pessoas. Vazias de cores das flores de papel. Vazias de música. Vazias do ruído dos dias de Festa e da chegada de pessoas que, da região e do país, escolhiam a segunda-feira de Páscoa para uma visita à vila. Pela Festa. Pela Fé. Pelos momentos de encontro entre pessoas.
As margens dos rios Tejo e Zêzere estavam desertas, apenas com a areia e, aqui e ali, os tufos de erva que cresce fruto de uma primavera muito molhada. Os próprios rios, principalmente o Tejo, mostrava aquilo que os partidos políticos e as forças desta região têm dito: “os caudais são tão baixos que se passa de uma margem para a outra a pé”. Sem as descargas das barragens para permitir uma maior navegabilidade o “Borda Rio” da Câmara de Constância demorou a encontrar águas mais profundas que permitissem que o Sérgio, o barqueiro, o conduzisse até perto da margem.
Com essa dificuldade a pequena comitiva que evocou o Dia do Concelho de Constância deslocou a Bênção simbólica da margem do Zêzere para a margem do Tejo. Fruto dos tempos de pandemia, duas dezenas de pessoas representaram nesta manhã, 5 de abril, os milhares de visitantes que ano após ano passam por Constância. Um barco da Câmara de Constância representou os cerca de 60 que, habitualmente, marcam presença na cerimónia. E uns estouros de morteiros a ecoar os céus da vila representaram o fogo que, em anos de procissão, é lançado enquanto a Senhora faz o seu percurso.
Pelas 10 da manhã, cerca de duas dezena convidados entre executivo municipal, presidentes das juntas de freguesias, representantes da Assembleia Municipal e mais algumas instituições do concelho marcaram presença para a cerimónia solene de mais um feriado municipal de Constância. Numa plateia improvisada em frente aos mastros dos Paços do Concelho, Sérgio Oliveira (presidente da Câmara Municipal), Jorge Pereira (vice-presidente da Câmara Municipal), António Mendes (presidente da Assembleia Municipal), José Rita (presidente da Junta de Freguesia de Constância), Ana Luísa Manique (presidente da Junta de Freguesia de Montalvo) e José Manuel Ricardo (presidente da Junta de Freguesia de Santa Margarida) ao som do Hino Nacional hastearam as bandeiras de Constância, União Europeia, Portuguesa e das juntas de freguesia de Constância, Montalvo e Santa Margarida, respetivamente.
Numa cerimónia curta e simples, transmitida pelas plataformas digitais do Município de Constância, Sérgio Oliveira fez uma evocação desta data. O presidente da Câmara deixou a nota inicial de uma vida castrada que só tem equivalência com “passagem” da Pneumónica ou “Gripe Espanhola” pelo nosso território, em 1918/19. O autarca vincou os tempos difíceis que vivemos, desde as instituições públicas passando pelos estabelecimentos comerciais que têm, igualmente, vivido momentos difíceis.
Depois Sérgio Oliveira virou-se para os tempos próximos, dizendo que a travessia do Tejo tem sido uma das grandes prioridades, mas que há ideias que andam há muitos anos nos planos e não passam daí. Por isso, deixou a indicação que, neste momento, as câmaras de Constância e Barquinha já não falam sozinhas. Agora são 13 municípios que defendem a necessidade de obras profundas na atual ponte rodoviária para alargamento e reforço da estrutura que permita o trânsito em duas vias e a construção de uma nova travessia entre Abrantes e Constância.
Sérgio Oliveira disse ainda ter convicção que há três grandes projetos para desenvolver com apoio de fundos da União Europeia nos próximos anos. A Praia Fluvial no Zêzere tem de ser um dos projetos âncora para o desenvolvimento turístico. E depois, afirmou o autarca, se o concelho quer uma ligação forte aos rios não pode ter o Museu dos Rios e das Artes Marítimas como tem. É preciso criar, construir um Museu novo que aumente ainda mais a visibilidade daquilo que é esta ligação ribeirinha ao rio, aos marítimos e à história desta atividade.
E depois, sublinhou ainda o autarca, a ampliação do Parque Industrial de Montalvo é outro das grandes linhas de orientação da autarquia para os próximos anos. Sem esquecer que Constância é um dos concelhos de baixa densidade populacional que tem cobertura quase a 100% de fibra ótica o que poderá permitir nos próximos anos um desenvolvimento de empresas ou negócios potenciados pelas economias digitais.
Sérgio Oliveira disse ainda à Antena Livre que os baixos caudais do Tejo, quem ultimamente voltaram à ordem do dia, é um problema que urge resolver. Quem esteve em Constância nesta evocação pode perceber que no rio pode andar-se a pé, com água abaixo do joelho.
Sérgio Oliveira espera, tal como todos os habitantes da vila e do concelho, que 2022 traga de volta as Festas do Concelho à “moda antiga”, ou seja, com três dias de animação e muitos visitantes.
Nuno Silva, Pároco de Constância, evocou, antes da Bênção, a chegada dos barcos para a cerimónia. “É um momento muito importante (a segunda-feira de Páscoa) porque evocamos a Senhora da Boa Viagem, evocamos todos aqueles já partiram e que nos partilharam da sua história e da sua vida”.
O pároco disse que a Bênção deste dia é, acima de tudo um sinal de respeito, para com essas gentes da “nossa terra”. Neste tempo de pandemia “queremos manter a palavra e a esperança”, disse ao mesmo tempo que referiu o simbolismo da Bênção da única embarcação presente.
“O nosso auxílio vem do Senhor.
O Senhor esteja convosco.
Sê propício Senhor às nossas suplicas, pelo Vosso poder misericordioso abençoai esta embarcação e todos os que nela navegarem, assim como vos Dignastes abençoar a Arca de Noé flutuante no dilúvio,
Dispensai-lhe Senhor o auxílio da Vossa proteção, assim como Ofereceste a Pedro, caminhando sobre as águas,
Enviai do céu o Vosso santo anjo que livre e guarde sempre esta embarcação de todo o perigo com todos os que nela se encontrarem,
e afastados de todos os perigos Dignai-vos fazer chegar sempre ao porto desejado e aos próprios lares estes vossos servos após uma viagem tranquila realizados plenamente de todos os seus trabalhos,
Vós que Viveis e Reinais pelos séculos dos séculos,
Ámen”
Cerimónia do hastear das bandeiras
Sérgio Oliveira no discurso transmitido pelas plataformas digitais do município
Comitiva restrita na margem do Zêzere aguarda a Bênção
Caudal muito baixo no rio Tejo provocou alteração na cerimónia
Barco do Município de Constância recebeu a Bênção de Nossa Senhora da Boa Viagem
Bênção foi transferida do Zêzere para o Tejo
O Padre Nuno Silva na Bênção
Ruas desertas em tempo de pandemia
Sem barcos, sem pessoas, sem música, sem encontros, sem festa, com silêncio, rua vazias mas com a Fé de que daqui a um ano Nossa Senhora da Boa Viagem e o concelho de Constância possam ser festejados da forma normal. Com a mesma Fé, mas com barcos, música e muitos encontros.