A imagem estereotipada do cientista é a de uma personagem com bata branca, fechada no laboratório e solitária.
Mas na realidade a carreira científica é um caminho escolhido por mulheres e homens inseridos no mundo e com ligação aos outros: colegas, amigos e família.
Esta vida para além da ciência não só é uma escolha salutar e natural como pode até contribuir para o avanço do conhecimento.
E a história de Peter Agre, médico e investigador norte-americano, é um excelente exemplo.
Mas como é que uma simples visita ao “Disney World” pode estar ligada a uma descoberta científica importante?
A dada altura no seu percurso académico o cientista e a sua equipa descobriram uma nova proteína que estava presente nos glóbulos vermelhos (que são células sanguíneas que transportam o oxigénio dos pulmões para os tecidos e órgãos do corpo), nos túbulos renais e também nas plantas.
O que poderia ser? E qual era a sua função?
Sem conseguir respostas a investigação encontrava-se num beco sem saída.
Até que, tal como ele conta numa entrevista a Stefano Sandrone no livro “Vida de Nobel”, surge um momento de pausa: a tradição familiar anual de acampar num parque nacional. Em 1991 Agre e a esposa perguntaram: onde querem ir este Verão? E a resposta das crianças foi “Disney World”. Lá concordaram com o compromisso de visitar na Flórida o Everglades e só depois o famoso parque de diversões.
Tendo em conta a longa viagem de regresso a Baltimore o cientista decidiu visitar o seu antigo mentor. Ao conversar sobre a recente descoberta e encruzilhada surgiu a seguinte ideia: será que a nova proteína era o canal de membrana há muito procurado pelos cientistas? E era exactamente isso: descobriram que a tal proteína tinha um papel crucial no transporte de água dentro das células. Por isso baptizaram-na com o nome de “Aquaporina”, que significa “canal de água”.
Esta descoberta decisiva abriu a porta a toda uma série de estudos bioquímicos, fisiológicos e genéticos dos canais de água em bactérias, plantas e mamíferos. Hoje, os investigadores podem seguir em pormenor uma molécula de água no seu percurso através da membrana celular e compreender por que razão só a água, e não outras pequenas moléculas ou iões, pode passar.
Tal é de grande importância para a nossa compreensão de muitas patologias como, por exemplo, doenças renais, cardíacas e neurológicas.
Por esta descoberta foi atribuído a Peter Agre (juntamente com o químico Roderick MacKinnon) o prémio Nobel da Química em 2003.
Luís Monteiro