SALPICOS DE CULTURA….
“Do Tempo sem tempo às perguntas bem formuladas”
Os períodos de confinamento a que tenho estado sujeito têm-me permitido pensar mais numas coisas que noutras. Porém existem problemáticas que me prendem mais o pensamento. Uma faz parte de reflexão continuada sobre aquilo que é o andar por cá, vivendo as vicissitudes da vida, e cumprindo um caminhar que se me apresenta obrigatório, embora reconheça que me foi dado o livre arbítrio de escolher qual o rumo do trilho que traço.
Uma das questões sobre a qual há muito criei ideias, e que serviu até de base à minha formação académica, prende-se com preocupação que me acompanha desde os vinte e poucos anos. Em obras publicadas tenho deixado escrito o que penso sobre isto que é andar por cá, e em textos que na Rádio Antena Livre têm sido emitidos venho também deixando as marcas das pegadas que a minha mente constrói quando me dou a pensar sobre o “tempo”. O que disse, escrevi e digo é que falar em tempo passado, pressente e futuro não faz sentido porque na minha opinião ele é sempre presente.
Tenho feito recorrentemente esta afirmação, e como cada cabeça sua sentença, se sou seguido por alguns, outros existem que me contestam. Aceito que assim seja, e tanto de uns como de outros tenho colhido sempre ensinamentos que me permitem refletir melhor sobre o assunto. Porém, nos últimos tempos uma forma de pensar a que tive acesso tornou-se para mim mais clarificante.
Um Amigo meu trouxe-me ao conhecimento a carta aberta que a cientista Maria de Sousa de 80 anos, escreveu pouco antes de ter falecido no dia 14 deAbril com o covid-19. A falecida era Prof. Da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa e investigadora do Instituto de Medicina Molecular. O texto que escreveu é, quanto a mim, um documento de importância significativa ao qual o Portugal de hoje deve prestar boa atenção, e eu aproveitando a oportunidade para falar aqui sobre o “tempo” deixo também expressa a minha homenagem à ilustre cientista.
Na sua carta transmitindo bem a noção que sabia qual o caminho que lhe estava destinado, transmite no texto ideias para o homem de hoje, mas que ao dizê-las como o faz, se transformam em mensagens sem tempo. Repare-se bem nalgumas delas:
“Espero perdurar por via dos que ficam vivos. Por mais dolorosa que seja a morte, a vida tal como a conhecemos na Terra é infinita. As novas gerações sucedem-se ciclicamente e cabe sempre a elas a construção do nosso futuro coletivo. Faz parte de ser jovem estar convencido de que vamos ser capazes de mudar o mundo para melhor.”
Fiquei sensível ao conteúdo de todo o texto que a investigadora nos deixou. Sendo algo de muito sentido revela lucidez no pensar e expressa ensinamentos de vida que podem ser cartilha de formação para uma boa cidadania. Uma das frases que para mim tem mais significado é aquela em que a autora expressa o entendimento de que “a vida, tal como a conhecemos na Terraé um processo infinito”. Porquê esta minha preferência? Vou explicar: se a vida é um processo infinito, então o tempo que levamos a percorrê-lo também o é, logo, é, conforme afirmo, um Tempo sem tempo.
Claro que aqui, aproveito o que a autora diz, para puxar a brasa à minha sardinha na defesa da ideia que defendo sobre a problemática da variável “tempo”. Mas atenção porque outras frases podem e devem também ser objeto de reflexão. Diz a Professora que faz parte de ser jovem estar convencido de que se vai ser capaz de mudar o mundo. Mas em jeito de conselho afirma que para isso é preciso ter coragem, porque muito habituado a ter vidas confortáveis, muitos dos humanos,pouco pensam na necessidade de viver e conviver em harmonia com a Terra.Deixando expressa a ideia que as novas gerações devem ser bem formadas na utilização da ciência, sabendo observar com rigor, deduzindo través de raciocínios lógicos, e baseando as suas convicções na adequada experimentação, lembra ainda que para a ciência não há temas de investigação inúteis, desde que as perguntas sejam bem formuladas.
Despeço-me com amizade,
Luís Barbosa*
*Investigador em psicologia e ciências da educação
SALPICOS DE CULTURA, uma parceria com a Associação Internacional de Estudos Sobre a Mente e o Pensamento (AIEMP)