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Manifestação contra a poluição no Tejo: as reações dos autarcas

6/03/2017 às 00:00

Cerca de 500 pessoas participaram no dia 4 de março na manifestação contra a poluição do rio Tejo e seus afluentes, no cais de Vila Velha de Ródão.

“Estamos aqui hoje para reclamar um rio Tejo livre de poluição. O diagnóstico está feito e infelizmente estão identificadas as fontes poluidoras”, disse à Antena Livre Samuel Infante, da Quercus, associação ambientalista que integra o movimento ProTejo.

O ambientalista recordou que “quando o rio Tejo entra em Portugal já tem problemas graves, como Almaraz, a poluição de Madrid. O Tejo já chega moribundo à fronteira”. Contudo, já em Portugal, o ambientalista sublinhou que continuam a registar-se descargas poluidoras diariamente, situação que afirma não poder continuar.

“Aqui em Vila Velha de Ródão temos problemas concretos, que estão identificados. Há indústrias como a Celtejo e a Centroliva que estão notificadas pelas autoridades e infelizmente continuamos a assistir a descargas diárias muitas vezes”, salientou.

“Nós sabemos que algumas indústrias anunciaram que vão fazer investimentos significativos nas suas ETAR’s. Agora, é necessário que a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) e o Ministro do Ambiente tenham mão firme, porque o diagnóstico está feito e é preciso passarmos à ação”, frisou.

Samuel Infante disse ser possível ainda “salvar o rio Tejo” e que “é possível um desenvolvimento sustentado e que se cumpra a legislação. Agora quem regulamenta e fiscaliza, quem atribui as licenças, tem de ter vontade política para fazer cumprir a lei”.

O ambientalista disse que milhares de empresas têm sido autuadas, mas que esses autos “não têm consequências”.

“Felizmente, o SEPNA tem atuado e têm sido levantados autos, mas depois esses autos não têm consequências. Portanto, o crime compensa. É essa a leitura que fazemos”, fez notar.

Manifestantes estiveram à frente dos portões da empresa Celtejo

Os manifestantes, que se concentraram no cais fluvial de Vila Velha de Ródão, iniciaram depois uma marcha que culminou com a leitura de um manifesto em frente aos portões da empresa Celtejo, fábrica de pasta de papel da Altri.

Sobre a adesão à manifestação, Samuel Infante disse que se tratava de “uma mensagem clara da sociedade civil que sente na primeira hora o problema”.

“Nós, Quercus, recebemos dezenas de queixas de cidadãos que moram aqui no concelho de Vila Velha de Ródão que têm problemas respiratórios e que deixam de viver no concelho. Há um impacto real na atividade económica e turística e não podemos permitir que isto continue”, vincou.

Na ação de protesto marcaram presença vários autarcas de Vila Nova da Barquinha, Mação, Entroncamento, Constância, Abrantes, Gavião, Ortiga, Praia do Ribatejo, Nisa, Tancos, Rio de Moinhos, Azambuja, Praia do Ribatejo, entre outros.

Fernando Freire, presidente da Câmara Municipal de Vila Nova da Barquinha, disse à Antena Livre que na “Barquinha fizeram-se milhões em investimentos e ainda se estão a fazer, nomeadamente com a requalificação das margens ribeirinhas, de Almourol e com o desenvolvimento de projetos no âmbito da gastronomia. Por isso, todas as manifestações, todas as apelações, todas as recomendações sobre o Tejo são bem-vindas e contarão sempre, enquanto eu for autarca, com a presença do presidente do Município na defesa de um bem essencial”. Fernando Freire acrescentou ainda que “esta luta está a começar. Este é um processo complexo, que requer a colaboração do Governo, nomeadamente do IGAMAOT e da fiscalização. Mas estamos atentos e determinados em tentar preservar o nosso Tejo e, para isso, temos que lutar. Não podemos desistir”.

“O Tejo é um recurso natural de extraordinária importância”

Já António Louro, vice-presidente da Câmara Municipal de Mação, avançou que presença do Município “é a demonstração clara e inequívoca de que o Município se encontra empenhado neste processo. Nós também já fomos causadores de alguns problemas, procurámos investir de maneira a que eles desaparecessem e conseguimos ter sucesso nisso. E estamos aqui solidários com todos aqueles que acham que a situação não pode continuar”.

“Temos que acelerar o passo e ver se, o mais rapidamente possível, se conseguem ultrapassar os problemas que continuam a afetar o Tejo. É nesse sentido que estamos aqui. Solidários, especialmente com todos os nossos munícipes que são da beira-rio mas não só, porque todos em Portugal têm interesse que o Tejo seja um recurso natural que nos orgulhe e que faça valer o peso que ele têm nas nossas tradições e na nossa cultura. O Tejo é um recurso natural de extraordinária importância para o concelho de Mação, especialmente na sua parte ribeirinha, onde tem grande importância em termos culturais, gastronómicos e económicos. Entendemos que este é um recurso fundamental para o futuro do concelho de Mação e de toda esta região e temos que o defender”, acrescentou.

A freguesia da Ortiga teve uma das maiores representações na manifestação em Vila Velha de Ródão. Foram cerca de centena e meia de populares que se deslocaram a esta vila portuguesa raiana no distrito de Castelo Branco. João Ferreira, o presidente da Junta de Freguesia de Ortiga, acreditava que a manifestação fosse “trazer algo de positivo”. “Para mim, o rio está morto. Se não está, está no fim”, desabafou. Referindo-se à atividade secular dos pescadores na Ortiga, confirmou que “os pescadores já desistiram quase todos”. “Temos que fazer alguma coisa para ver se alteramos isto tudo”, referiu João Ferreira que demonstrou ainda preocupação com o funcionamento da central de Almaraz.

Presente na manifestação esteve também César Estrela, vereador do PS na Câmara Municipal de Mação. Disse estar ali “enquanto cidadão e co-proprietário do Tejo, como somos todos. E temos que zelar por aquilo que é nosso. A ideia é defender uma posição que é de toda a gente, seja de que partido ou associação for”.

O vereador afirmou ainda que “o rio tem que ser visto tanto pelo prisma da paisagem e do ambiente como também tem que ser muito visto pelo prisma da economia. Compreendo alguma retração no sentido de não se tomar uma posição tão evidente pois há sempre interesses que têm que ser defendidos, mas cada um sabe dos seus. O interesse maior e que se sobrepõe a todos os interesses é o estarmos presentes, é o dizermos que isto é mau, que o que está a ocorrer é perigoso e é perigoso, sobretudo, para aqueles que hão-de vir. Temos a obrigação de deixar este legado às futuras gerações”.

Por sua vez, Manuel Jorge Valamatos, vereador da Câmara Municipal de Abrantes, referiu ser necessário “demonstrar a nossa preocupação com estas questões, quer da qualidade quer da quantidade da água. Estamos convictos e muito esperançados que possamos ver as ações estabelecidas pelo Governo, nomeadamente pelo Ministério do Ambiente, postas em prática. O que desejamos é que possamos voltar a ter o nosso rio mais limpo, sem esta brutalidade enorme de poluição e com caudais de água que consigam fazer retornar o habitat natural de toda uma vida”.

“Nesta altura, sentimo-nos muito frustrados e muito tristes por aquilo que vamos presenciando no dia-a-dia. É urgente que se tomem medidas eficazes que façam com que o rio seja devolvido às pessoas porque pertence a todos e faz-nos falta”, fez notar.

"Só os surdos é que não serão capazes de ouvir aquilo que, às vezes até no silêncio, é absolutamente ensurdecedor”

António Mor, presidente da Assembleia Municipal de Abrantes referiu ser “de tal maneira grave a razão porque aqui estamos... por ser o maior rio da península, por ser o que é para a nossa região...”. E deixou uma acusação: “alguém parece estar mais interessado em matar o Tejo… alguém está interessado em que ele deixe de ter esta função boa, que é múltipla relativamente a todas as atividades que toca”. 

Relativamente à manifestação, o presidente da Assembleia Municipal de Abrantes disse que “com a paz construímos e vamos fazendo mudar positivamente o mundo e é nesse conceito que aqui estou. Só podemos acreditar que vamos salvar o rio, porque até em matéria de legislação comunitária, os valores têm vindo a ser aferidos. Ou salvamos o mundo ou deixamos de ter o planeta Terra”.  

E mostrou-se esperançado, dizendo estar “convencido que, por estas formas ordeiras que defendem apenas e só o bem de toda a gente, eu penso que só mesmo os surdos, mudos e cegos é que não serão capazes de ouvir aquilo que, às vezes até no silêncio, é absolutamente ensurdecedor”.

Rio de Moinhos, freguesia ribeirinha do concelho de Abrantes, também marcou presença. Rui André, presidente da Junta de Freguesia relembrou que “Rio de Moinhos é uma freguesia banhada pelo rio Tejo e com uma cultura ribeirinha desde o seu início. Estando o rio poluído, é de todo o interesse da nossa comunidade marcar presença e mostrar aos poluidores, aos políticos e a quem tem poder na matéria para que tentem minimizar o impacto a nível de poluição e de podermos tornar o rio Tejo um rio melhor”.

Entre os manifestantes que se deslocaram de Abrantes, encontrámos também Nelson Carvalho, ex-presidente da Câmara Municipal e o primeiro autarca a investir nas margens ribeirinhas do concelho. Relembrou que “no meu segundo mandato, lançámos um programa ambicioso que se chamava “Cuidar do Tejo”, que significava eliminar a lixeira e fazer a recuperação ambiental, construir e elevar o nível de tratamento de todas as ETAR da bacia, desde Rio de Moinhos a Alvega, e fez-se esse investimento para limpar o Tejo e para evitar que o Município de Abrantes fosse poluidor porque tínhamos outro uso para o rio e queríamo-lo limpo”.

“Passados estes anos, sobretudo nos últimos três anos, é absolutamente inqualificável. Não é possível que um rio, com a grandeza e o valor económico e ambiental do Tejo, esteja anos seguidos sujeito a este regime que nós vemos diariamente nas redes sociais. É vergonhoso!”, denuncia Nelson Carvalho.

O ex-autarca acusa ainda as autoridades pela falta de informação. Disse que “o que a mim me custa, sobretudo, é o silêncio das autoridades durante este tempo. Eu gostava de saber, e gostava que o Ministério do Ambiente do anterior Governo e deste também, nos tivesse dito o que foi feito, as notificações que já foram feitas às empresas, o calendário de obras para fazer ETAR ou para requalificar e pôr a funcionar as que existem e qual o prazo que foi dado. Custa-me imenso não saber e eu não sou, propriamente, um cidadão mal informado. Não tem havido esse cuidado de manter as populações informadas, nomeadamente sobre o que se está a fazer, o que foi determinado que se fizesse, os prazos e os calendários...”

“O que temos assistido no Tejo é uma situação insustentável”, declarou.

Segundo o ProTejo, "as águas do rio Tejo estão negras, cheias de mantos de espuma branca e que consubstanciam casos de poluição extrema, devidamente fotografados e filmados por membros do ProTejo e cidadãos preocupados".

Por isso, as associações ambientalistas exigem que o Governo tome medidas imediatas em relação às licenças de emissões poluentes das fábricas.

Joana Margarida Carvalho e Patrícia Seixas 

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