A associação Zero considerou hoje que a diminuição de incêndios em 2023, em relação aos dois anos anteriores, pode transmitir “uma falsa sensação” de mudança nos comportamentos, afirmando que há medidas “a marcar passo” e desvalorização do fogo posto.
No dia que marca o início da fase mais crítica de incêndios (‘nível Delta’), que se estende até 30 de setembro, a Zero faz uma avaliação ao relatório anual de atividades do Sistema de Gestão Integrada de Fogos Rurais (SGIFR), relativo ao último ano, que contabilizou menos 2.866 fogos e menos 75.588 hectares (ha) ardidos do que em 2022.
Em 2023, foram registados 7.523 fogos face aos 10.389 de 2022 e aos 8.223 de 2021, e uma menor área ardida - totalizando 34.509 ha, sendo que no ano de 2022 chegou-se aos 110.097 ha, por contraste com o ano de 2021 em que a área ardida só foi de 28.415 há.
“Estes números muito positivos podem transmitir-nos uma falsa sensação de que está a acontecer uma modificação dos comportamentos face ao fogo e que a desejável mudança estrutural nas políticas públicas com impacto nos territórios está a ocorrer com a celeridade necessária”, observou a Zero em comunicado.
Para a associação ambientalista, ainda existem “muitas medidas” importantes que estão a “marcar passo”, alertando que “os fogos rurais são um problema social que continua longe de estar resolvido”.
“Parece continuar a existir uma certa desvalorização do papel do incendiarismo na perpetuação do flagelo dos fogos, apesar de este constituir um crime previsto no código pena (…), o qual prevê penas de prisão até oito anos, que se forem de especial gravidade poderão chegar aos 12 anos”, realçou, indicando que nos últimos três anos o fogo posto representou 19% dos incêndios contabilizados.
Face aos casos de fogo posto, a Zero referiu que não se compreende “a gritante falta de empenho na monitorização e no acompanhamento da reincidência, assim como ao nível da reinserção dos incendiários no pós cumprimento de penas”.
O organismo acrescentou que não se percebe também “o desprezo que se verifica pela necessidade urgente de criação de um programa para apoio e acompanhamento pela prática de fogo posto no âmbito da saúde mental, associado ou não a comportamentos aditivos e dependências”.
No comunicado hoje divulgado, a Zero lamentou ainda a tolerância de comportamentos negligentes que têm impacto na área ardida, como o lançamento de foguetes (58 ocorrências e 31 ha ardidos), a realização de fogueiras (201 ocorrências no período de 2021-2023), a queima de lixo (334 ignições e 238 ha queimados), fumar na proximidade de espaços suscetíveis de arderem (702 ocorrências e 602 ha ardidos) ou a queima de sobrantes agrícolas e florestais (3051 ocorrências e 7.457 ha).
“Importa não esquecer que a negligência, também ela um crime, continua a ser muitíssimo tolerada entre nós, como se comportamentos imprudentes (…) fossem normais num contexto em que já foram gastos milhões de euros na sensibilização dos cidadãos para que sejam mais responsáveis”, sublinhou.
Observando o abrandamento do ritmo da implementação do Plano Nacional de Ação e do SGIFR, a associação considerou que “não será possível atingir as metas previstas para 2030” e que as dificuldades financeiras, no âmbito do Programa de Financiamento Multifundos, “são incompreensíveis”.
“No que concerne à remuneração dos serviços de ecossistemas, o relatório continua a não nos dar notícias positivas, sendo que não é possível aferir a área abrangida por este mecanismo e também não é possível obter informação sobre a percentagem de proprietários que prestam serviços dos ecossistemas e que são remunerados por isso”, concluiu.
Os meios de combate voltarão a ser reforçados a 01 de julho até 30 de setembro, estando este ano em prontidão 14.155 operacionais de 3.162 equipas e 3.173 viaturas, um ligeiro aumento em relação a 2023.
No entanto, a época considerada mais crítica em incêndios rurais vai contar este ano com 70 meios aéreos.
Lusa